Título: Gasto com custeio já supera investimento em R$ 700 milhões
Autor: Sérgio Gobetti
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/12/2005, Nacional, p. A12

Números contrariam discurso do governo; despesa cresceu 21% neste ano, segundo dados do Ministério do Planejamento

BRASÍLIA - Apesar dos esforços anunciados pelo governo para reduzir as despesas de custeio da máquina administrativa, os números oficiais do Ministério do Planejamento mostram que os gastos nessa área continuam crescendo, acumulando alta de 21% nos 10 primeiros meses deste ano, em comparação com igual período de 2004. No total, o governo já gastou R$ 8,6 bilhões em 2005 em despesas como diárias de viagens, passagens, material de consumo, locação de mão-de-obra, consultorias, entre outros serviços prestados por empresas contratadas. O valor supera até o total dos investimentos, que mal somava R$ 7,9 bilhões até outubro, num ano em que o Palácio do Planalto prometeu dar prioridade às obras de infra-estrutura necessárias ao desenvolvimento do País. O quadro mostra uma evidente anomalia. O investimento é, por essência, uma das principais atividades de um governo, ao lado dos serviços de saúde e educação, enquanto custeio é o meio que o governo utiliza para executá-los.

Este é o segundo ano consecutivo em que os gastos de custeio crescem. Em 2004, a alta foi de 25%, depois de um primeiro ano de governo Lula em que os mesmos haviam sido cortados em 17%, em pleno processo inflacionário. Considerando um período de tempo maior, entre 2000 e 2004, o crescimento das despesas com a máquina chegam a 45%, enquanto os investimentos apresentam evolução de 7,6%.

Esses fatos mostram que há enorme distância entre as intenções da equipe econômica e a realidade concreta. O programa de ajuste fiscal de longo prazo apresentado pelo Ministério do Planejamento apregoa uma série de medidas para conter as chamadas despesas correntes do governo, mas na prática nenhuma delas precisaria ser implementada para começar a reduzir o custeio da máquina.

Enquanto um programa mais profundo de ajuste fiscal depende até mesmo de soluções constitucionais, como a alteração das vinculações orçamentárias, a redução do custeio pode ser viabilizada administrativamente e por decisões políticas. Em março, a equipe econômica cogitou de delimitar um teto para essas despesas, mas desistiu diante da resistência de determinados ministérios. Hoje, na prática, os limites de gasto impostos para cada ministro se referem ao custeio como um todo, quando não são computados em conjunto com os investimentos.

Entre os itens da despesa que mais cresceram nos últimos cinco anos estão o gasto com aquisição de passagens (89%) e material de consumo (77%). No início de agosto, o governo chegou a baixar uma portaria para limitar os gastos com viagens. O objetivo era proibir os ministérios a despenderem em diárias e passagens mais do que no ano passado, e a medida começou a surtir alguma efeito. Na semana passada, entretanto, uma nova portaria foi baixada flexibilizando os limites de vários órgãos, começando pela Presidência, que ganhou R$ 6 milhões a mais nessa área.

PREGÃO ELETRÔNICO

Os técnicos do Planejamento argumentam que ainda existem dificuldades e resistências para reduzir os gastos de custeio, mas garantem que avanços importantes já foram obtidos em áreas onde é possível monitorar mais de perto a despesa. É o caso dos bens e serviços adquiridos por meio de pregão eletrônico, modalidade de compra em que o governo faz uma espécie de leilão pela internet.

Os bens comprados dessa forma custaram R$ 3,4 bilhões neste ano, ante R$ 4,2 bilhões no ano passado.

A maior parte dos bens adquiridos por pregão, como medicamentos, não faz parte do chamado custeio da máquina e, por isso, não aparece no levantamento da Secretaria de Logística e Tecnologia do Ministério do Planejamento. Já outras despesas que aparecem no levantamento, como as relacionadas a obras e equipamentos, são complementares aos investimentos, como é o caso do gasto com manutenção de estradas, que cresceu 190% neste ano.

Na lista de custeio, a despesa de maior magnitude se refere a serviços prestados por pessoas jurídicas, o que inclui contratos na área de informática, limpeza, vigilância, telefone, fornecimento de energia elétrica e água, entre outros serviços terceirizados. Juntos, esses serviços já custaram R$ 5,1 bilhões aos cofres federais neste ano, ante R$ 4,4 bilhões em 2004 - crescimento de 16% em média.

Outro item da despesa que também cresceu muito nos últimos anos e continua crescendo em 2005 é a locação de mão-de-obra. Dos R$ 556 milhões gastos em 2000, o governo ultrapassará a cifra do R$ 1 bilhão até o final deste ano. Parte do crescimento verificado em 2005 (29% em média) é atribuído pelo governo às atividades de censo do IBGE e às equipes de fiscalização e monitoramento do programa Bolsa Família que foram montadas pelo Ministério do Desenvolvimento Social em todo o País.

"A máquina pública, à medida em que é reestruturada, começa a crescer e demanda maiores gastos de custeio", argumenta um assessor do ministro Paulo Bernardo, do Planejamento. De acordo com ele, o governo Lula trabalha para aumentar a qualidade e a transparência do gasto.