Título: Acordo muda projeto de lei do aborto
Autor: Simone Iwasso
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/12/2005, Vida&, p. A14

Hoje, às 15 horas, será apresentada para votação na Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados uma nova versão do projeto de lei que descrimina o aborto no País. O texto atual, composto por três artigos, propõe apenas a retirada do Código Penal dos itens que tipificam como crime o aborto feito com o consentimento da gestante.

O projeto anterior colocava, além disso, a regulamentação de como o procedimento deveria ser oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e pelos planos privados, na tentativa de acabar com a prática ilegal, que acarreta, por ano, cerca de 250 mil internações de mulheres nos hospitais públicos. A estimativa é que cerca de 1 milhão de mulheres façam abortos ilegais todos os anos no País.

Além disso, a versão anterior previa, por exemplo, que a prática ficava permitida até a 12ª semana de gestação, subindo para a 20ª em caso de gravidez decorrente de estupro. As alterações, segundo o Estado apurou, foram provocadas por um acordo com os deputados da comissão, que aceitavam votar o projeto se não contivesse as regulamentações, que provocaram discussões técnicas e financeiras, principalmente ao tratarem dos planos de saúde.

Como está, o projeto de lei deixa para o Ministério da Saúde fazer posteriormente as regulamentações da prática. "O essencial é tirarmos o aborto do Código Penal. Porque a partir daí, ele passa a ser tratado na esfera da saúde. A gente avançou na regulamentação para facilitar para o Executivo. Mas o mais importante é descriminar, acabar com a indústria do aborto ilegal", afirma a deputada Jandira Feghali (PC do B-RJ), relatora do substitutivo do projeto de lei.

Foi ela quem pediu a suspensão da votação na semana passada, justamente para modificar o texto e fazer as alterações, consideradas uma flexibilização necessária pelos movimentos que defendem o projeto. "Compreendemos que seria melhor a forma já normatizada, pois trazia garantias de que além de ser retirado da esfera criminal, o aborto também sairia da clandestinidade. Mas entendemos que, no momento, é o que é possível. Já é um avanço", diz Gilberta Santos Soares, coordenadora das Jornadas pelo Direito ao Aborto Legal e Seguro.

No entanto, para os grupos contrários, a modificação não altera o ponto essencial. "Não faz diferença tirar a regulamentação, porque ao tirar o aborto como crime, está se permitindo que ele seja feito. E isso é contra o direito inviolável à vida", afirma a deputada Angela Guadagnin (PT-SP). "As pessoas que realmente consideram o aborto um crime, vão continuar contra. Vai haver um acirramento das posições."

De todo jeito, a votação será um teste do projeto, bastante polêmico e combatido por setores ligados principalmente à Igreja Católica. A proposta foi enviada pelo governo após os trabalhos de uma comissão tripartite, que contou com representantes da sociedade civil. Caso seja aprovado, o projeto irá para a Comissão de Constituição e Justiça. Somente depois irá ao plenário da Câmara. O mesmo precisa acontecer no Senado antes de virar lei.