Título: Pecuária de corte está em pé de guerra
Autor: Agnaldo Brito
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/12/2005, Economia & Negócios, p. B18

Em 32 meses, custo de produção subiu 24% e o preço da arroba caiu 14%

A cadeia da pecuária de corte está em guerra. O motivo aparente são as declarações do presidente do Friboi, José Batista Júnior, admitindo formação de cartel e prática de dumping. O episódio reacendeu a proposta de criação da CPI da Carne e ampliou a frente de investigação de suspeitas de cartelização do setor com a chegada do Ministério Público Federal de Cuiabá (MT). Há quem duvide de tal poder e considera apenas bravatas as declarações de Batista Júnior. Mas, a cada dia, aumenta a sensação entre os pecuaristas de que estão perdendo a briga no mercado do boi gordo. Pior, o setor está apavorado com a depreciação do capital, acelerada neste semestre.

Levantamento feito, a pedido do Estado, pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Cepea/Esalq) mostra os motivos da crise.

O Custo Operacional Total (COT) da pecuária de corte para boi cresceu 24,51% entre fevereiro de 2003 e setembro deste ano, antes do episódio da febre aftosa em Mato Grosso do Sul. A partir disso, a situação só piorou. O COT considera despesas como depreciação de máquinas, compra de cercas, galpões e novos investimentos.

Os custos operacionais efetivos (COE), nos quais estão os chamados "desembolsos mensais" para compra de vacinas, medicamentos e despesas correntes - aumentou 18,58% no mesmo período, entre fevereiro de 2003 e setembro de 2005.

O problema é que não houve compensações. No período levantado na pesquisa, o preço da arroba do boi caiu 14,8%. A ligeira recuperação no início de outubro desapareceu com os focos de febre aftosa.

Segundo Sergio De Zen, professor e pesquisador do Cepea, o Friboi é um grupo grande e forte. Mas, garante, seu poder é regional. Para o o pesquisador, a queda do preço do boi gordo se deve à incorporação de tecnologia pela pecuária de corte.

O peso dos insumos não agrícolas usados na pecuária cresceu. De 1994 a 2003, os insumos não agrícolas (vacinas, suplementação de ração, compra de cercas, entre outros produtos) elevaram a participação no PIB da pecuária de corte de 5,4% para 7,85%, incremento de 45,3% no período. "Isso é incorporação de tecnologia e tem efeitos nos ganhos de eficiência e na produtividade", diz De Zen.

CRISE

Não são os únicos indicadores. O Cepea tem reproduzido dados do IBGE que mostram o aumento da produção de boi por unidade de área. Em 1996, o Brasil tinha 0,89 animal por hectare. Em 2003, a relação subiu para 1,10, aumento de 23%. Em Mato Grosso, a evolução no período foi mais expressiva: de 0,72 boi por hectare para 1,14, incremento de 58%. Em todo o Centro-Oeste, houve crescimento de 30,8%. "Com a queda de preços, os pecuaristas responderam com mais oferta", explica De Zen.

O avanço tecnológico na pecuária de corte deu ao Brasil um plantel superior a 180 milhões de cabeças. Mas a descapitalização em curso, que pode provocar ajustes, equivale a dizer que o setor pode encolher nos próximos anos. "A renda da pecuária, de maneira geral, hoje é incapaz de remunerar o capital investido. É fato que há depreciação do capital dos pecuaristas", diz De Zen.