Título: Mais pressão por ajustes na economia
Autor: Lu Aiko Otta, Beatriz Abreu
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/12/2005, Economia & Negócios, p. B8

Amanhã, Lula se reúne com Palocci, Dilma e Bernardo para fazer um diagnóstico da conjuntura e avaliar possíveis mudanças

BRASÍLIA - Esta deverá ser mais uma semana infernal para o ministro da Fazenda, Antonio Palocci. Logo amanhã, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pretende pôr em discussão os três pilares de sua política econômica - os juros, o câmbio e o gasto público. Desse encontro, participarão também a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, e o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo. A idéia é fazer um diagnóstico sobre a economia e avaliar possíveis ajustes. "Cada um vai poder falar o que quiser, mas é preciso manter o bom senso", comentou um importante integrante do governo.

Desse debate, dificilmente resultará uma guinada na política econômica. De acordo com assessores, o presidente não está disposto a correr riscos e colocar por terra um dos principais êxitos de seu governo, que é a queda da inflação e recuperação da renda das famílias.

Porém, essa discussão deverá intensificar a artilharia do chamado fogo amigo, os ataques à política econômica vindos de dentro do próprio governo.

A briga promete ser boa, porque o Banco Central, alvo preferencial dos ataques da semana passada, não está ouvindo as críticas calado. Desde quarta-feira, quando o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou que a economia encolheu 1,2% no terceiro trimestre, o BC começou a ser pressionado para acelerar a queda dos juros, e assim animar a economia.

Desde outubro, a taxa de juros vem caindo a um ritmo de 0,5 ponto porcentual por mês (hoje, a taxa de juros básica da economia, a Selic, está em 18,5% ao ano).

Cortes mais drásticos foram defendidos pelo o vice-presidente, José Alencar, pelo ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Luiz Fernando Furlan e até pelo ministro Paulo Bernardo, tradicional aliado de Palocci nos embates dentro do governo.

O próprio presidente Lula pôs os juros na berlinda, "O dado concreto é que o fato de o PIB ter decrescido é um alerta para nós: olhe, vamos ver o que aconteceu direitinho, vamos ver o que a crise política e os juros têm de incidência nisso, vamos ver porque os empresários não fizeram os investimentos", declarou o presidente durante reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), o Conselhão, quinta-feira.

O Banco Central não se intimidou e resolveu partir para o ataque. Em conversas com economistas e formadores de opinião, seus dirigentes deixaram claro que, mesmo sendo surpreendente, a queda de 1,2% no Produto Interno Bruto (PIB) não deveria causar afobação para cortar juros.

Primeiro, porque o dado do IBGE refere-se ao período entre julho e setembro, ou seja, ao passado. Agora, a economia já está reagindo. O crescimento de 15,4% na venda de veículos, ocorrida de outubro para novembro, é só um exemplo.

Segundo, porque não há tanto espaço assim para cortar os juros.

Basicamente, os juros altos servem para desestimular o consumo e, assim, deixar menos espaço para a inflação crescer. Porém, a inflação vem crescendo e já está fora da trajetória prevista.

O governo queria terminar o ano com uma inflação de 5,1%, mas ela ficará pouco acima de 5,5%.

Mais preocupante ainda para o BC, o próprio dado do IBGE mostra que o consumo das famílias aumentou 0,8% no terceiro trimestre.

Mais consumo é mais combustível para a inflação, portanto não há como abandonar a cautela nos juros.

Os analistas de mercado apostam que o BC cortará os juros em 0,5 ponto porcentual também em dezembro. No máximo, cortará 0,75 ponto, não mais.

A pressão, porém, promete ser violenta. Já no final de outubro, durante a reunião da Câmara de Política Econômica em que foi exposto o programa de ajuste de longo prazo (aquele classificado de "rudimentar"), a ministra Dilma deixou clara sua impaciência com a lentidão do BC em cortar os juros.

A uma certa altura, passou uma descompostura no presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, reclamando que os juros não caem e, assim, obrigam o governo a fazer um enorme esforço para economizar e manter a dívida sob controle. Coube ao diretor de Política Monetária, Afonso Bevilaqua, defender a política monetária.