Título: `STF está perdendo credibilidade¿
Autor: Rosa Costa
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/11/2005, Nacional, p. A26

Péres diz que crise pode se tornar`gravíssima¿ se Supremo continuar ignorando autonomia do Congresso

O senador Jefferson Péres (PDT-AM) teme que a crise política possa ¿se tornar gravíssima¿ se o Supremo Tribunal Federal (STF) continuar ignorando a autonomia do Congresso para julgar parlamentares. Ele critica especialmente seu presidente, Nelson Jobim, a quem acusa de defender os interesses do deputado José Dirceu (PT-SP) quando o STF julga ações que ele apresenta. Para ele, isso e o fato de Jobim não negar a intenção de candidatar-se à Presidência prejudicam o STF e afetam sua credibilidade.

Por que está aborrecido com o STF?

Em primeiro lugar, pelo silêncio do presidente do STF, que não desmente de forma categórica que é pré-candidato à Presidência e está até articulando a sua candidatura. Em segundo, há as decisões do Supremo em relação aos pedidos de Dirceu.

A mim parece que alguns ministros abusam, exorbitam do poder do tribunal de interferir no assunto interno da Casa, que é o processo de cassação de um deputado. O STF, ou pelo menos alguns ministros, insistem em seguir estritamente as regras do processo penal, que não são aplicáveis ao caso do Conselho de Ética por quebra de decoro. Neste caso, o Código de Processo Penal só pode ser aplicado subsidiariamente, se o Congresso quiser. O último julgamento, portanto, me deixou preocupado com a atuação do Supremo.

Os jornais noticiaram que Jobim está articulando sua pré-candidatura.

Ah, não, não acredito. Essa postura é incompatível com o cargo que exerce. Os juízes do Rio Grande do Sul lhe disseram: ¿Ou Vossa excelência desmente que é candidato ou, então, renuncie ou se aposente.¿ E ele silenciou.

Jobim não tem direito de silenciar porque isso está atingido muito a imagem do Supremo. A população está perdendo o respeito pelo Supremo. Tudo ocorre em meio a uma grave crise política que atingiu a credibilidade do Executivo e do Legislativo. Agora vem o Supremo perder a credibilidade.

A crise, de grave, pode se tornar gravíssima. Quando o guardião da Constituição, a mais alta corte de Justiça de um país, começa a perder credibilidade, fica sob a suspeita de que alguns de seus ministros, e em particular o seu presidente, perderam a isenção, estão comprometidos politicamente, isso é gravíssimo.

O sr. não se sente solitário ao reagir ao STF, quando entidades como OAB e AMB e até os presidentes da Câmara e do Senado não o fazem?

Talvez eles estejam temerosos de lançar mais lenha na fogueira. Não querem fragilizar ainda mais o mais importante tribunal do Brasil. Talvez seja uma posição de cautela. Realmente, se todas essas entidades começarem a bombardear o STF, ele pode sair desmoralizado.

Como o senhor avalia Jobim?

Eu não entendo a posição de Jobim, ele é uma pessoa altamente qualificada, experiente ¿ com quem eu tenho ou tinha excelente relação. Não sei como é que um homem como ele não percebe que essa postura é inaceitável pela sociedade. Das duas uma: ou ele é realmente candidato, e neste caso deveria assumir isso, se aposentar e vir para a vida política.

Ou desmentir peremptoriamente que seja candidato. Ele não faz nem uma coisa nem outra. Toma a posição de silêncio, a pior de todas. Porque quem cala consente. Então para a sociedade ele é candidato. Vamos admitir que ele não seja candidato e entenda que não deve desmentir o que não existe. Isso é um erro porque, desta forma, está dando a entender que é candidato. É a pior posição, porque o Supremo perde a credibilidade.

Se o Supremo atender a Dirceu e ainda assim ele for cassado pela Câmara, que cenário teremos?

A Câmara pode dar a interpretação que basta tirar o testemunho da Kátia (Rabello, presidente do Banco Rural) e vota a cassação do Dirceu. O STF faça o que quiser. Se o tribunal não acatar a decisão, aí é crise com certeza e vai para sociedade, que reagirá indignada. Se o ministro Sepúlveda Pertence decidir contra a cassação do Dirceu, a Câmara pode votar pela cassação, retirando o depoimento da Kátia. Se acaso, um pouco antes, Dirceu conseguir medida liminar no Supremo, aí é crise mesmo.