Título: `Isso tudo é síndrome de conspiração¿
Autor: Roldão Arruda
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/11/2005, Nacional, p. A23

Jobim critica quem busca enxergar interferência do Judiciário no Legislativo e nega que tenha cogitado idéia de disputar Presidência

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Nelson Jobim, disse ontem que a mais alta Corte do País não se sente ameaçada ou pressionada diante da decisão dos partidos de oposição de não votar o orçamento da União enquanto não for definido o julgamento sobre o processo de cassação do deputado José Dirceu (PT-SP). Para Jobim, está em curso uma ¿síndrome da conspiração¿, na qual se procura enxergar interferências de poderes externos no Supremo e a interferência do Judiciário no Legislativo. Jobim disse que a decisão de deixar o País sem orçamento reflete o exacerbamento da crise política, mas não significa a existência de uma crise institucional, resultante do choque entre Legislativo e Judiciário. Ele ressaltou que os políticos terão de explicar à Nação como o País ficará sem orçamento.

Em São Paulo, onde esteve à noite para proferir uma palestra sobre o funcionamento do Legislativo, Jobim afirmou: ¿A decisão de não votar o orçamento é política, sem sentido, mas claramente política. Ela mostra o nível do relacionamento que se trava no Congresso e dá a dimensão do conflito político.¿

Sobre a possibilidade de se pressionar a decisão judicial, afirmou: ¿O Supremo que não se constrange com absolutamente nada. Nem o regime militar constrangeu o Supremo. Lembrem-se que o Supremo concedia habeas corpus contra o regime militar. Aqueles que pretendem desrespeitar decisões judiciais são exatamente aqueles que não sabem conviver no processo democrático.¿

Se a decisão dos políticos for atingir o presidente Lula, segundo Jobim, também se trata de um erro. ¿Agem como se o presidente fosse responsável por uma decisão do Supremo. Quem é responsável somos nós. E a Constituição.¿

Respondendo a uma pergunta sobre as críticas de que o Executivo acaba interferindo indiretamente no Judiciário, no processo de escolha de ministros, afirmou: ¿Não há nenhuma interferência política de presidente. Se você pegar o caso específico, verá que dois ministros indicados pelo atual presidente votaram contra.¿

E emendou: ¿ Isso tudo é uma síndrome de conspiração em cima de uma circunstância. Quando se afirma que isso faz parte de uma estrutura, que decorre desta ou daquela situação, é aquela necessidade de sempre se procurar razões ocultas, quando seria mais fácil verificar as razões efetivas no exercício da função.¿

ELEIÇÕES

Jobim negou que tenha sequer cogitado a possibilidade de ser candidato a presidente ou vice-presidente da República no próximo ano. Contou que, ao participar de um jantar na casa do senador Fernando Bezerra (PTB-RN), um dos convidados disse que o PMDB precisaria ter o seu próprio candidato. ¿Eu fiquei de lado, nem participei da conversa. E disse: `Me deixa fora desse assunto.

Não tenho nada que ver com isso¿.¿ Ele disse que pretende continuar trabalhando no Supremo no ano que vem. Mas fez uma pequena ressalva: ¿Em princípio é isso. Mas o futuro a Deus pertence.¿ O presidente do STF foi enfático ao assegurar, durante a entrevista coletiva, que a Corte está exercendo a sua função.

¿A função constitucional é preservar o exercício, direitos e pretensões individuais no que diz respeito a processamentos.¿

VOTAÇÃO

Para Jobim, o presidente da Câmara, Aldo Rabelo (PC do B-SP), está correto ao manter a data de votação do processo de cassação de Dirceu, uma vez que a decisão judicial ainda não foi acertada.

Mas advertiu: ¿Se o Supremo conceder a liminar e o Congresso tiver votado, todo o procedimento será anulado.¿

Sobre as críticas de que o Supremo estaria interferindo no Legislativo, disse: ¿É um juízo completamente desarrazoado daqueles que não conhecem o texto constitucional.¿

Ele ainda rebateu as críticas de que deveria ter se resguardado durante os debates no Supremo e votado por último: ¿Essas críticas mostram o desconhecimento total do regime interno do Supremo e das regras constitucionais. O presidente do Supremo vota sempre quando a matéria é constitucional.¿

Ao comentar as críticas do presidente da Comissão de Ética, Ricardo Izar, de que a Justiça estaria politizada, afirmou: ¿Isso mostra o equívoco e a politização de um juízo do processo constitucional.¿

Ele também foi enfático nos comentários sobre uma possível crise institucional. ¿Não há conflito institucional. Cada um está exercendo suas funções de acordo com a Constituição. Só haveria crise institucional se algum abusasse das suas funções.¿