Título: É hora de pensar no futuro, diz Armínio Fraga
Autor: Paulo Sotero
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/12/2005, Economia & Negócios, p. B10

Para ex-presidente do BC, novo governo deve apostar em agenda de reformas já no início do mandato

Para o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga, aparentemente a política econômica do governo brasileiro, acompanhada por poucas reformas estruturais, já deu os frutos que poderia e é hora de começar a pensar no futuro. Em artigo de duas páginas publicado na revista Finance & Development, que está disponível a partir de hoje no site do Fundo Monetário Internacional (FMI), o economista abre o debate sobre o que o próximo governo deve fazer, aconselhando o eleito das urnas em 2006 a apostar o capital político da vitória eleitoral numa forte ofensiva para levar adiante a agenda de reformas, hoje estancada por causa da crise política. O conselho é extensivo ao México, um dos 17 países da América Latina e Caribe que elegerão governantes em 2006. "Meu palpite é que a melhor estratégia para os novos governos do Brasil e do México será avançar nas reformas estruturais no início do mandato, quando o impulso do sucesso eleitoral pode prevalecer", escreveu. "Presumindo que isso trará algum crescimento, outras reformas podem se tornar factíveis."

O ex-presidente do BC rechaça a tese dos que buscam as causas do crescimento econômico pouco expressivo e irregular do Brasil e da América Latina nos últimos anos no receituário do Consenso de Washington. "Minha conclusão é diferente: enquanto o número de crises (financeiras) caiu na região nos anos 90 (de 26, nos anos 80, para 9), a maiorias dos países deixou de implementar os principais aspectos do Consenso e, em conseqüência, falharam em consolidar a estabilidade macroeconômica com credibilidade."

Isso foi ilustrado, diz ele, pelas altas taxas de risco país e as baixas classificações de crédito que prevaleceram na maioria dos países da América Latina nos anos 90, especialmente comparando com a Ásia. "Países que seguiram as linhas gerais do Consenso se deram melhor do que os que não seguiram: o Chile teve o melhor desempenho macroeconômico e o primeiro e melhor repertório de execução de reformas estruturais."

Entre as várias dúvidas subjacentes ao desempenho medíocre da maioria dos países, uma grande questão para o futuro, segundo Armínio, é se Brasil e México - as duas maiores economias da região, que implementaram parcialmente as políticas do Consenso - "seguirão o bem-sucedido caminho do Chile ou sucumbirão à tentações populistas, sejam da variedade suave da Argentina (controle de preços e incerteza regulatória) ou do tipo venezuelano mais extremo, que põe em risco a democracia e aspira a um sonho bolivariano de unir a América Latina".

Nesse ponto, Fraga diz que é "cautelosamente otimista". Segundo ele, o crescimento recente da Argentina e Venezuela, obtido após profundas recessões, ainda não inspiram confiança sobre sua durabilidade a longo prazo. "Em contraste, Brasil e México parecem ter conseguido livrar-se do círculo vicioso de crises e populismo." Para ele, isso é "sinal de maturidade".

"O governo Luiz Inácio Lula da Silva não fez progressos em várias áreas-chave, mas a política macroeconômica permaneceu sob estrito controle e deve ficar assim durante o que, tudo indica, será uma quente campanha política em 2006", escreveu. "Há razões para preocupações quando se pensa nas dificuldades que ambos os países estão tendo para mobilizar apoio político para as reformas estruturais ainda necessárias."