Título: Meirelles reage e defende juros altos
Autor: Isabel Sobral
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/12/2005, Economia & Negócios, p. B4

Na ausência do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, fez ontem um discurso contundente em defesa da política de juros, em resposta à crescente onda de manifestações no governo por mudanças. Ontem, o presidente Lula voltou a falar de "ajustes" na política econômica, reforçando as críticas da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, do presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, Guido Mantega, e do presidente da Petrobrás, José Sérgio Gabrielli. Meirelles disse que a política monetária não é um instrumento "nocivo e manipulado com teimosia e fervor", numa clara defesa dos diretores do BC, que têm sido taxados de intransigentes na execução da política monetária.

A reação de Meirelles evidencia - não só pela veemência, não usual nele, mas pelo conteúdo - que a política monetária é cláusula pétrea para a equipe econômica. Ele até admitiu que a elevação dos juros enfraqueceu a economia, mas disse que "infelizmente, não é possível atuar diretamente sobre a inflação sem manter sob controle o crescimento da demanda".

E insistiu na necessidade de persistir nesse caminho que, segundo ele, dá credibilidade ao BC. As críticas à política de juros elevados subiram de tom na semana passada, depois da divulgação da queda de 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB) no terceiro trimestre. Meirelles afirmou que é missão do BC controlar a inflação e essa missão é delegada pelo próprio governo, pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) e pela sociedade.

Numa das poucas passagens não lidas do discurso previamente elaborado para a abertura do seminário interno Riscos, Estabilidade Financeira e Economia Bancária, ele fez questão de ressaltar a responsabilidade da instituição para evitar a aceleração inflacionária.

ENDEREÇO CERTO

O comentário teve endereço certo. Mantega, por exemplo, elevou o tom no fim de semana, atribuindo a culpa pelo crescimento negativo unicamente à diretoria do BC. O presidente do BNDES trava uma batalha com a equipe econômica para reduzir a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), usada para corrigir os financiamentos do banco, hoje em 9,75% ao ano.

Gabrielli juntou-se aos descontentes ligados às correntes mais radicais do PT, segundo fontes do próprio governo, e anteontem afirmou que "o mundo vai além da estabilidade de preços e das metas inflacionárias".

Meirelles rebateu, sem citar os colegas de governo, dizendo que os resultados recentes não sustentam as conclusões de que o BC seja uma instituição "inflexível, que não tolera desvios" da meta. Respondendo a essa crítica, ele lembrou da atitude flexível da instituição ao estender até o fim de 2006 o objetivo de alcançar a meta de inflação de 4,5%. Assim, na explicação de Meirelles, a busca da meta foi diluída em 24 meses.

Em outro trecho do discurso, Meirelles enfatizou que o Banco Central não é insensível ao que acontece com o nível de atividade do País porque é um fator considerado na definição do ritmo para que a taxa de inflação seja convergente para as metas de longo prazo.

Quando o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulado em 12 meses subiu de 5,2% para 7,6%, entre maio e dezembro de 2004, destacou Meirelles, a decisão de baixar a inflação levou em conta a atividade e, por isso, a meta de 4,5% foi estendida para dois anos. O intervalo de variação tolerada para a meta, no entanto, foi reduzido de 2,5 pontos porcentuais para 2 pontos porcentuais.

'NÃO HÁ MÁGICAS'

O presidente do BC contra-atacou as reclamações de excessivo apego da instituição em alcançar a meta fixada, afirmando que o País não pode ceder à tentação de afrouxar sua política justamente quando os primeiros resultados aparecem, porque ainda faltam ajustes para que eles sejam consolidados.

"Não há mágicas. O que se evita de custos associados ao controle da inflação num dia, acaba-se pagando em dobro no futuro", disse Meirelles, acrescentando que essa dificuldade também deriva da menor credibilidade que terá o BC com os agentes de mercado.

A necessidade de se manter essa credibilidade em alta também foi destacada no discurso. Ele ressaltou que a inflação, segundo os agentes de mercado financeiro, deverá terminar este ano em 5,6%, um pouco acima do objetivo de inflação de 5,1% perseguido pelo BC.

No entanto, foi a persistência dessa política monetária, segundo Meirelles, que ajudou a manter as expectativas dos agentes para 2006 próximas da meta estipulada pelo governo.

Segundo o boletim Focus, divulgado anteontem pelo BC, os analistas esperam um IPCA de 4,51% no final do ano que vem. "Esse é um momento de vitória para a sociedade no sentido de conquistar um política monetária crível", afirmou.