Título: 'Não vamos fazer loucura na economia por causa de eleição'
Autor: Tânia Monteiro
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/12/2005, Nacional, p. A4

Depois de ter admitido em pelo menos duas oportunidades que faria ajuste na política econômica, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu ontem, com veemência, as diretrizes cambiais e monetárias, assegurando que não haverá mudanças por causa das eleições do próximo ano. "Não vamos fazer loucura", declarou ele, na última entrevista do ano a emissoras de rádio. "O ajuste vai se dando."

O presidente admitiu viver momentos de dúvida em relação à política de juros, embora tenha apontado aspectos positivos dela. "As pessoas falam dos juros altos e reclamam. Às vezes eu penso que têm razão, às vezes penso que não", continuou. "A média de juros nestes 36 meses é praticamente a metade da dos últimos 15 anos no Brasil. É uma média de juros razoavelmente pequena, com picos de juros altos, como estamos agora."

Em outro momento da entrevista, afirmou que ele próprio, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, e o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, querem os juros mais baixos: "Você não pensa que o Palocci quer? É lógico que quer. Você não pensa que o Meirelles quer juros mais baixos? É lógico que quer. Você pensa que eu não quero? Eu quero." Lula disse que "os juros vão cair, a gente vai poder crescer mais e, na medida em que a gente crescer mais, o PIB vai aumentar e a gente pode até ter um superávit menor, mas estas coisas não serão decididas em função de um ano eleitoral."

O presidente mudou o discurso em relação a divergências internas. Depois de ter dito que havia espaço no governo para que todos expusessem suas posições, condenou os ministros que criticam publicamente políticas do governo. Citou o titular do Planejamento: "Eu chamei a atenção do ministro Paulo Bernardo quando ele falou de uma política de ajuste fiscal de longo prazo, antes de se transformar em política de governo. Eu até posso, mas nenhum ministro pode pensar uma coisa e sair falando, antes daquilo se transformar em política de governo. Não existe a palavra fogo amigo", assegurou. "No dia em que você tomar uma queimada você vai perceber que não tem fogo amigo; mesmo que seja tua esposa que te queime, você vai sentir a dor."

O presidente procurou afastar a impressão de que o governo está cindido entre o grupo de Palocci, que quer segurar os gastos públicos, e o da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, que pretende ampliar investimentos. "O presidente não tem ala", garantiu. E defendeu, com ênfase, a política econômica, ao reiterar que a recuperação do crescimento já está acontecendo, no quarto trimestre do ano: "É só pegar os dados".

O presidente assegurou, ainda, que "o ajuste do câmbio" deve ser feito pelo próprio mercado e que o governo não adotará nenhuma medida para forçar uma eventual desvalorização do real frente ao dólar. "Não vamos desvalorizar o real por decreto. Isso já foi feito e não deu certo. A taxa de câmbio vai encontrar um ponto de ajuste em algum momento."

Falou, em seguida, da importância da autonomia atual do Banco Central na política monetária . "Eu acho que o Banco Central é autônomo. Acho não, eu tenho certeza porque, embora tenha gente que queira que a gente mande uma lei para ser aprovada no Congresso Nacional, eu prefiro a autonomia do jeito que está."

Ele voltou a comparar economia com futebol, dizendo que não se pode mudar o técnico a cada problema. "Temos de acertar com as pessoas que têm competência para acertar." É preciso "garantir que o Brasil tenha, durante alguns anos, um ciclo virtuoso de crescimento para que a gente possa devolver à sociedade brasileira o estado de bem-estar social que ela perdeu nesses últimos 25 anos." Afirmou também que o crescimento deste governo "vai passar a média do governo anterior". Disse estar convencido "de que a economia vai crescer muito mais fortemente em 2006".