Título: Desembaçando o cenário de 2006
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/12/2005, Economia & Negócios, p. B2

Anteontem o Brasil captou US$ 500 milhões no mercado internacional, com o lançamento de bônus soberanos, pagando juros menores do que na emissão anterior, ambas de longuíssimo prazo. Com isso o Tesouro Nacional já conseguiu dólares suficientes para rolar 77,7% da dívida externa que vencerá em 2006, numa estratégia de vender mais papéis do que o necessário. Busca antecipar-se, assim, às incertezas internas e externas que poderiam surgir no ano eleitoral. Esta foi a décima operação de colocação de bônus soberanos em 2005: US$ 8 bilhões foram captados no total, o maior montante num único ano.

Os bônus vencerão em 2034 e renderão juros efetivos de 8,31% ao ano, correspondendo a 363 pontos básicos acima dos papéis norte-americanos de mesmo prazo. O custo menor se deve à constante redução do risco Brasil nos últimos meses. Em maio, uma emissão de mesmo valor foi colocada pagando 440 pontos básicos acima do juro norte-americano.

Os recursos entrarão na caixa do Tesouro no dia 6 de dezembro, ajudando a elevar as reservas cambiais, que já cresceram quase US$ 4 bilhões entre 1º e 29 de novembro, atingindo US$ 64,1 bilhões.

A facilidade na captação de recursos decorre da percepção, no mercado externo, do aumento do superávit nas contas correntes. Graças a essa melhora, a Fazenda tenta evitar pressões que poderiam se fazer sentir sobre a cotação do câmbio em 2006, com influência negativa sobre os preços internos.

Cabe recordar que, neste ano, a desvalorização do dólar foi decisiva para derrubar a inflação oficial para os níveis previstos no programa de metas de inflação, pouco mais de 5,5% anuais.

Mas será preciso contar com algo mais em 2006, pois é evidente a impossibilidade de continuar desvalorizando o dólar como em 2005. Os juros básicos norte-americanos estão subindo, o que já basta para fortalecer o dólar em relação a outras moedas conversíveis.

As autoridades contam com correções baixíssimas dos preços administrados em 2006. Isso também reduzirá o IPCA, o que permitiria alguma desvalorização do real ante o dólar sem afetar as metas de inflação.

A colocação de títulos soberanos é compatível com a estabilidade cambial e monetária e com a remoção de incertezas para 2006, quando os agentes econômicos já estarão olhando para a política econômica do futuro governo.