Título: Abstenção é de 75% na Venezuela
Autor: Lourival Sant'Anna
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/12/2005, Internancional, p. A9,10

Apuração indica 84% dos votos para partido de Chávez na nova Assembléia, mas abstenção elevada é vitória para oposição

CARACAS - O presidente Hugo Chávez fracassou em levar os venezuelanos às urnas ontem. Apenas 25% dos eleitores compareceram às eleições para a nova Assembléia Nacional, segundo projeção divulgada às 20h50 em Caracas (22h50 em Brasília). Embora o governo tenha obtido controle absoluto sobre o Parlamento unicameral, o alto índice de abstenção, de 75%, representa uma vitória para a oposição, que boicotou a eleição, alegando riscos de fraudes. Haviam sido contados 2,97 milhões de votos, dos quais 2,5 milhões (84%) foram para a aliança liderada pelo Movimento Quinta República, o partido de Chávez. Segundo o presidente do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), Jorge Rodríguez, os votos contados correspondiam a 79% do total de comparecimento. A Venezuela tem 11.956.000 de eleitores inscritos. Quatro dos cinco principais partidos da oposição se retiraram da disputa, na semana passada. A lei não estabelece um comparecimento mínimo, mas a votação ganhou um aspecto plebiscitário, de aprovação ou não ao governo Chávez.

¿Temos ouvido porta-vozes dizendo que essas eleições são normais¿, disse Maria Corina Machado, da organização não-governamental Súmate. ¿Não concordamos. O normal, em eleições, é que o povo vote.¿ Para ela, ¿o povo, com sua conduta, exigiu a renúncia do CNE¿.

O dia transcorreu calmo, à exceção da informação, divulgada pelo governo, de duas explosões, em um oleoduto e em um gasoduto, no Estado de Zulia, noroeste do país, ocorridas na noite de sábado. Uma chuva fina começou a cair por volta das 9 horas em Caracas, e continuou por todo o dia, diminuindo o ânimo dos eleitores. Já em seis Estados do país, as chuvas foram fortes, atrasando o início da votação, previsto para as 6 horas. Cada seção se manteve aberta por um total de dez horas, ou enquanto houvesse filas.

O governo estimulou a participação dos eleitores, colocando à sua disposição transporte gratuito. No bairro popular 23 de Enero, reduto de chavistas, 15 lotações circulavam gratuitamente, levando e trazendo eleitores, de acordo com Mauricio Urbina, do Coletivo La Libertad, grupo de mobilização popular sustentado pelo governo e controlado pelo MVR.

Os partidos tradicionais oposicionistas Ação Democrática e Copei, assim como os mais novos Primeiro Justiça e Projeto Venezuela, anunciaram sua saída da disputa na semana passada, alegando que as urnas eletrônicas importadas dos Estados Unidos não garantem o sigilo do voto. As máquinas, fabricadas pela companhia Smartmatic, armazenam a ordem dos votos, o que, segundo os oposicionistas, permitiria identificar as opções dos eleitores.

Denunciando o risco de fraude, a oposição exigiu que todos os votos fossem contatos manualmente, já que as máquinas imprimem um comprovante. O CNE não aceitou, garantindo apenas uma auditoria em 45% das urnas ¿ que consiste em comparar a contagem dos comprovantes impressos com a ata eletrônica.

Ao votar no bairro 23 de Enero, Chávez festejou a ¿hora da morte¿ dos oposicionistas que promoveram o boicote. Segundo ele, a Venezuela tem ¿o processo eleitoral mais cristalino, flexível e seguro da América do Sul¿, e a versão de que há uma crise política no país foi criada pelos ¿lacaios do imperialismo¿, já que só 10,8% dos mais de 5 mil candidatos às 167 cadeiras da Assembléia Nacional renunciaram. O presidente, no entanto, disse esperar que seja possível ¿recompor a oposição¿.