Título: Renda variável é uma boa aposta
Autor: Tom Morooka
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/12/2005, Investimentos, p. H1

Tendência de queda dos juros e manutenção de quadro externo favorável devem beneficiar mercado de ações

O mercado financeiro chega ao fim de 2005 animado com o cenário desenhado para os investimentos em 2006. A pedra de toque que vai ditar a decisão dos investidores, segundo analistas, é a perspectiva de continuidade do processo de redução da taxa básica de juros. A dúvida é quanto à intensidade em que ela deverá ocorrer, se em ritmo mais lento, e portanto por um período mais longo, ou em velocidade mais acelerada. Uma novidade para 2006 é que, em vez de reuniões mensais, como vinha ocorrendo desde janeiro de 1998, o Comitê de Política Monetária (Copom), que decide o rumo dos juros, vai promover apenas oito encontros por ano. Dá alento à expectativa de redução dos juros a projeção de inflação, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo-IPCA, contida dentro da meta de 4,50% para 2006. A convergência desse indicador para a meta ficou reforçada pelo mergulho do IGP-M neste ano, resultado da queda livre das cotações do dólar. O forte recuo do IGP-M, que teve variação de apenas 1,22% no ano, até novembro, é um fator de alívio para a inflação do próximo ano, porque esse indicador é usado para reajuste de preços administrados como os de energia e telefonia, entre outros, principais vilões da inflação até agora.

Os analistas comentam que, por aí, há bastante espaço para a poda dos juros. A novidade em 2006 é que, pela primeira vez desde 1998, o juro básico nominal poderá cair abaixo de 15% ao ano (ver projeções no quadro).

A idéia é que o recuo da inflação e, em sua esteira, dos juros estimule gradualmente o investidor a migrar da renda fixa para opções na renda variável que acenem com rentabilidade superior à remunerada por juro.

RISCO POLÍTICO

A eleição presidencial constitui sempre um fator de incerteza, mas a avaliação é que, desta vez, a escolha do novo presidente em 2006 não deve provocar sobressaltos como em 2002, relacionados ao temor de possível alteração no curso da economia. "O mercado financeiro já aprendeu a descolar da questão política, nada deve abalar a expansão do crédito e da economia", diz Sérgio de Oliveira, diretor-executivo do Bradesco. "O Brasil é a bola da vez , o investidor estrangeiro deve continuar com apetite pelo País."

O estrategista de Investimentos do BankBoston, Odair Abate, também não acredita que o ano eleitoral leve à reprise da volatilidade de 2002. "À luz dos supostos candidatos com mais chance hoje, não haveria risco de mudanças na política econômica atualmente em vigor." O superintendente de Renda Variável do Banco Itaú, Walter Mendes, comenta que o cenário político preocupa pouco e menos o investidor estrangeiro. Ele diz que a questão não é a troca de presidente, mas uma possível mudança na economia, embora não acredite nessa possibilidade. "A idéia é que é pequeno o espaço para mudança na política econômica."

O tesoureiro do Banif Investment Bank, Rodrigo Boulos, segue a mesma linha de raciocínio, mas lembra que a questão é se em hipótese de reeleição o presidente Lula contaria com Antonio Palocci no comando da Fazenda em seu segundo mandato. "Sem Palocci, cresce a possibilidade de mudança na economia e os ativos poderiam passar a incorporar esse risco a qualquer momento em 2006."

O interesse pela manutenção da política econômica em vigor significa a defesa, entre outros pontos, de geração de superávit fiscal (economia de recursos) para pagamento de parcela substancial de juros da dívida pública, compromisso com as políticas cambial de taxas flutuantes e metas de inflação, contenção de gastos públicos em linha com a Lei de Responsabilidade Fiscal. São políticas que garantem a estabilidade da moeda e a confiança dos agentes econômicos, sobretudo do investidor estrangeiro.

CENÁRIO EXTERNO

As incertezas externas, as mesmas que têm deixado os investidores de prontidão há algum tempo, persistem, mas a expectativa é que o quadro internacional permaneça positivo, o que deverá continuar favorecendo o mercado financeiro doméstico. A previsão é que a liquidez internacional (dinheiro que fica zanzando pelo sistema financeiro) permaneça ampla, o juro de curto prazo americano não suba muito além do nível atual (4% ao ano), o preço do petróleo se estabilize ao redor de US$ 60,00 o barril e a economia mundial persista em crescimento.

Odair Abate, do BankBoston, diz que, dada à provável manutenção dos fundamentos internos, o mercado de investimentos estará refletindo mais o quadro econômico internacional. Ele diz que dúvidas com o ritmo de crescimento chinês, com o preço do petróleo, a economia e o déficit em conta corrente americanos será mantida. "São variáveis que deverão ser acompanhadas, mas não dá para apostar no pior."

O executivo Walter Mendes, do Itaú, diz que o cenário externo continuará favorável para os mercados emergentes, principalmente ao Brasil. Segundo ele, a melhora das contas externas e a queda do risco país devem manter o fluxo de recursos para a bolsa e a renda fixa. "A melhora de indicadores dá idéia de que o País segue para a condição de investment grade (grau de investimento)."

A combinação de cenário interno de continuidade de bons fundamentos econômicos com o externo sugere uma perspectiva favorável para investimento em ações, opinam os especialistas. O superintendente da área de investimentos do Banco Real, Eduardo Jurcevic, comenta que o investidor procura outras opções quando o juro nominal mensal fica perto de 1%.

"A expectativa é boa, poucas vezes se viu um cenário tão atraente para aplicação em renda variável", diz Kelly Trentin, analista da SLW Corretora.