Título: FAO critica resultados do Fome Zero
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/12/2005, Nacional, p. A15

O programa Fome Zero, vitrine do início do governo Luiz Inácio Lula da Silva, não está avançando como esperava a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, a FAO. "O programa tem trazido menos resultados do que esperávamos", afirmou ontem ao Estado, em Genebra, um dos principais economistas da entidade, Hartwig de Haen, do Departamento Social da FAO. Em seu relatório anual, divulgado ontem, a entidade registrou que existem hoje no mundo 852 milhões de pessoas malnutridas, a maioria delas no campo. Na América Latina, o número chega a 53 milhões - eram 59 milhões em 1990.

Em termos absolutos, o relatório aponta que o maior número de famintos se encontra na Ásia: são 519 milhões. Em termos porcentuais, porém, a situação mais grave é a da África, onde um terço de toda a população - 204 milhões de pessoas - vive sem alimentos suficientes.

ASSISTENCIALISMO

O economista avalia que o programa brasileiro ainda tem caráter "assistencialista" e alerta para a demora em outras ações de governo para combater a fome e a má nutrição.

"As reformas estruturais e mais fundamentais ainda não foram feitas, como a reforma agrária. A maioria dos famintos hoje no Brasil estão no campo e muitos precisam de terra. Por isso a reforma agrária seria importante", afirmou Hartwig. Para ele, o Fome Zero ainda precisa de tempo para surtir efeitos.

Apesar da crítica à demora no combate à fome, a FAO destaca que o consumo de calorias aumentou na América Latina na última década - hoje é de 2,8 kcal por dia por pessoa. No Brasil, aumentou de 2,8 kcal para 3 kcal entre 1990 e 2002, ficando acima da média da região. Os dados ainda mostram que o número de malnutridos no País caiu de 18,5 milhões em 1990 para 15,6 milhões em 2002, ou seja, de 12% para 9% da população. Esses dados, porém, são anteriores ao Fome Zero.

O combate à fome no mundo também tem mostrado avanços, mas o número absoluto de malnutridos não foi revertido.

Em 1969, 37% da população passava fome. Hoje, esse número é de 17%, mas, diante do crescimento da população mundial, a queda real é quase insignificante, segundo a FAO.

A fome no mundo está localizada onde o PIB agrícola sofreu queda nos últimos anos. Por isso, o crescimento da agricultura é fundamental para o combate à fome, adverte a FAO. Segundo a entidade, quanto mais integrados estão os países aos mercados agrícolas mundiais, menor é a proporção de pessoas malnutridas no país.