Título: Superávit não é intocável, diz Dilma
Autor: Fabio Graner
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/12/2005, Economia & Negócios, p. B1

A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Roussef, admitiu ontem que a meta de superávit primário (economia para pagar os juros da dívida) de 4,25% não é mais intocável para o governo. Após almoço com o comando da Marinha, Dilma sinalizou que, embora esta meta esteja mantida para este ano e para 2006, em um cenário de crescimento econômico acelerado e de taxas de juros em queda, o governo pode diminuir o tamanho do esforço fiscal necessário para manter a trajetória da dívida pública em queda.

Enquanto Dilma falava com maior tranqüilidade sobre os ajustes na política econômica admitidos na terça-feira pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ministro das Relações Institucionais, Jaques Wagner, indicava uma maior unidade de discurso no governo.

Os ajustes, disse ele, 'são na posologia, não nos pilares'. 'Quem viveu a turbulência da crise, como o presidente, e não se abalou na condução serena da economia, não fará mudanças.'

A correção de rumo não seria feita sem o ministro da Fazenda, Antonio Palocci. Ontem, pela primeira vez, a ministra fez uma defesa enfática da permanência de Palocci no comando da política econômica: 'Não há a menor hipótese de ele ser afastado. Temos clareza que Palocci deu grande contribuição para a economia', sentenciou, lembrando que isso já havia sido dito pelo presidente.

Dilma, no entanto, mantém sua análise de que a economia pode comportar taxas de juros menores e uma meta menos ambiciosa para o superavit primário. 'Você me questionou que, se houver melhora acentuada nas variáveis econômicas, muda o superávit primário?

Eu respondo: sim. Mas um cenário bom ocorre a posteriori, não tenho como saber quando vai ocorrer', afirmou a ministra que, pouco antes, havia traçado um cenário bastante favorável para 2006.

'Há todas as condições para um crescimento sustentável acima de 4%', disse Dilma. 'Em 2006 haverá uma confluência virtuosa que permitirá que tudo seja mais fácil.' Questionada se, com esse cenário positivo, em 2006 a meta de superávit já poderia ser reduzida, a ministra deixou a possibilidade em aberto: 'Esperamos.

Nós temos sempre expectativas otimistas. Agora, eu acredito que, enquanto a situação econômica não se alterar, a meta do Brasil é 4,25%'.

Depois de o governo ter discutido um plano fiscal de longo prazo que previa a manutenção do superávit em 4,25% por dez anos, a fala da ministra indica que o vento do debate interno sobre a política fiscal está tomando outro rumo. As declarações de Dilma podem levar a um novo embate com a equipe econômica, que, notoriamente, prefere manter ou aumentar o superávit primário e deixá-lo elevado por um longo período.

A ministra, porém, em vez de debater sobre uma meta de longo prazo, prefere falar de mudanças. Segundo ela, é mais fácil fazer alterações na economia numa conjugação de fatores positivos do que em momentos de crise.

'É aquela velha história de que é melhor fazer ajustes com a bicicleta andando do que com ela parada.' Para Dilma, o processo de queda no juro, além de fundamental para estimular o crescimento, é crucial para determinar um superávit primário menor.

'Os juros mais baixos permitem várias coisas, entre elas uma valorização do dólar e, obviamente, também permitem uma política de superávit fiscal menos intenso', disse ela. 'O superávit é função da taxa de juros.

À medida que você tem taxas de juros decrescentes o superávit tenderá a ser menor.'

Demonstrando otimismo com os rumos da economia, a ministra disse ainda que a queda do PIB no terceiro trimestre reflete o processo de alta nos juros realizado há mais de seis meses e, com a inversão dessa trajetória pelo Banco Central, a tendência é a retomada do crescimento.

Ela já espera uma recuperação neste último trimestre - embora não arrisque dizer de quanto. 'A política que levou à queda de 1,2% não ocorreu há dez dias. Há uma defasagem de seis meses. Minha expectativa é que tenhamos crescimento bastante melhorado do PIB.'