Título: Kirchner ressuscita Carlos 'Chacho' Álvarez
Autor: Denise Chrispim Marin
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/12/2005, Economia & Negócios, p. B11

"Charlatão e com certa ineficácia, mas honesto, nobre, até". Essa é a impressão que, segundo o analista de opinião pública Enrique Zuleta Puceiro, os argentinos têm de Carlos "Chacho" Álvarez, ex-vice-presidente da República e ex-garoto prodígio da política argentina. Na semana passada, Álvarez ressurgiu das cinzas ao ser designado novo presidente da Comissão de Representantes Permanentes do Mercosul, por pedido expresso do presidente Néstor Kirchner, seu amigo pessoal. Álvarez, que tomará posse do novo cargo amanhã, durante a cúpula de presidentes do Mercosul, em Montevidéu, substituirá o ex-presidente provisório da Argentina, Eduardo Duhalde, que desde o início do ano mantinha um duro confronto com Kirchner.

Duhalde completou um ano na presidência do organismo executivo do Mercosul. Poderia ter aspirado a uma prorrogação de mais um ano, mas a rivalidade com Kirchner, que pedia sua cabeça, o impediu.

As regras do Mercosul mandavam que o substituto de Duhalde fosse um representante de um dos outros três países do bloco. Mas Kirchner impôs novamente um argentino para o posto.

A designação de Álvarez teve a aprovação imediata do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas não foi bem digerida por Uruguai e Paraguai. A escolha causou problemas internos no governo do socialista Tabaré Vázquez, presidente do Uruguai. Seu chanceler, Reynaldo Gargano, segundo informações extra-oficiais que circularam em Montevidéu e Buenos Aires no fim de semana, teria apresentado a renúncia por não ter sido consultado.

Vázquez conseguiu colocar panos quentes na crise, que provocaria a primeira renúncia de um ministro de seu gabinete. Na segunda-feira, o governo uruguaio desmentia que Gargano tivesse apresentado a renúncia.

O analista Rosendo Fraga sustentou que a designação de Álvarez teve aprovação de Lula, mas destacou que Paraguai e Uruguai foram informados quando a situação estava definida. "A Argentina e o Brasil dirigem o Mercosul sem consultar adeaquadamente os outros dois sócios", observou.

OSCILANTE E DUBITATIVO

Os analistas portenhos perguntam-se se o oscilante e dubitativo ex-vice-presidente é a pessoa adequada para comandar o Mercosul em 2006, ano que promete ser pleno de problemas e desafios internacionais. "Álvarez é símbolo de rebeldia antiestablishment, mas também de impotência, fuga e decepção", disse ao Estado o analista político Silvio Santamarina.

Em Buenos Aires, a designação de Álvarez foi encarada com sarcasmo, já que ele era considerado um "cadáver político" até a semana passada. Sua ex-colega do Frepaso (partido que Álvarez comandou nos anos 90), a ex-ministra e ex-senadora Graciela Fernández Meijide, sugeriu que seu ex-amigo não estaria psicologicamente capacitado para esse posto (ou qualquer outro). Segundo Meijide, "Chacho tem dificuldades pessoais com o exercício do poder".

Álvarez deixou o Partido Justicialista (Peronista) em 1989, por discordar da guinada neoliberal de Carlos Menem (1989-99), e fundou a Frente Grande, posteriormente transformada em Frepaso. Nos anos 90, o partido virou a terceira força política do país.

Em 1999, foi eleito vice-presidente de Fernando De la Rúa (1999-2001), mas ficou só dez meses de governo. Apesar dos pedidos populares para que permanecesse, Álvarez renunciou em meio de um confuso episódio no qual denunciou de forma vaga a existência de subornos do governo a senadores.