Título: Venezuela começa hoje a entrar no Mercosul
Autor: Denise Chrispim Marin
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/12/2005, Economia & Negócios, p. B11

Pela terceira vez este ano, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, deverá monopolizar as atenções de um encontro de líderes sul-americanos e ofuscar a presença de seu companheiro Lula. Entre hoje e amanhã, em Montevidéu, os presidentes do Mercosul autorizarão o início do processo de adequação da Venezuela às regras do bloco - com a ressalva de que, somente ao final, o país vai se tornar membro efetivo. Inédita na história do Mercosul, a iniciativa foi qualificada pelo ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, como "um ato enriquecedor para a geopolítica da região". Os termos do acordo foram concluídos ontem pelos negociadores e o seu texto final será o principal trunfo desta 29.ª Reunião de Cúpula do Mercosul. O texto prevê que o processo técnico de adesão da Venezuela será mais lento que o político.

Na próxima cúpula, na Argentina, o novo sócio terá assento em todas as reuniões. Chávez poderá participar, portanto, da reunião do Conselho do Mercado Comum, da qual participam os presidentes e ministros. Mas não terá voto, apenas voz.

Ontem, na reunião de ministros dos quatro sócios - na qual Amorim foi representado pelo embaixador José Eduardo Felício, subsecretário de Assuntos de América do Sul do Itamaraty - comentava-se o possível pedido de adesão da Bolívia. "O Sul, de Mercosul, não é de Cone Sul. Tanto que é Mercado Comum do Sul. Foi a mídia quem transformou em Cone Sul", afirmou Amorim ao Estado, ao destacar que a Venezuela, além de país andino, também poderá fazer a ponte do Mercosul com o Caribe. "Cria-se uma vértebra para a integração da América do Sul."

Chávez roubará um pouco mais a cena. Em encontro marcado, em princípio, para o início da noite de hoje com os presidentes Lula e Néstor Kirchner, da Argentina, Chávez pretende reiterar a aliança estratégica entre os três países. Celebrada em Montevidéu, em fevereiro, essa aliança teve como foco a integração energética. Um de seus principais itens é a construção de um gasoduto que partirá das jazidas da região de Puerto Ordáz, na Venezuela, para Manaus, dali atingindo Uruguai, Argentina, Chile, Paraguai e Bolívia.

Segunda-feira, o ministro de Minas e Energia, Silas Rondeau, preparou o terreno ao assinar, em Caracas, um acordo para o início das obras do primeiro trecho (Puerto Ordaz-Manaus). A medida será ratificada por Lula e Chávez.

Otimista quanto à incorporação de um novo sócio pleno ao Mercosul, Amorim afirmou que esse processo se dará com todo o cuidado para que não haja problemas reais com a Comunidade Andina de Nações (CAN), bloco do qual a Venezuela faz parte e com o qual o Mercosul firmou um acordo de livre comércio que está na base da integração sul-americana. Segundo o chanceler, os "problemas de percepção" deverão ser desfeitos.

Nesta reunião de cúpula, o Mercosul deverá assinar três medidas que, em tese, darão mais sustentação ao bloco - a criação de um fundo estrutural de convergência, a instalação do Parlamento em 2006 e o primeiro passo para o fim da dupla cobrança da Tarifa Externa Comum (TEC).