Título: OEA exige 8 medidas da Febem
Autor: Camilla Rigi
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/12/2005, Metrópole, p. C3

A Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) determinou oito medidas a serem cumpridas pelo governo do Estado de São Paulo para melhorar as condições de internação do Complexo Tatuapé da Fundação do Bem-Estar do Menor (Febem). Em resposta, a Secretaria da Justiça e Defesa da Cidadania vai convidar os juízes da corte para visitarem o local, na zona leste. Entre as medidas, estão o impedimento de internações prolongadas e maus-tratos, garantia de atendimento médico e emocional, redução do número de internos no complexo e divisão dos jovens pela faixa etária e perfil dos crimes cometidos (Veja ao lado). "O que esperamos agora é que o Estado cumpra o que o tribunal ordenou", disse a diretora do Centro pela Justiça e pelo Direito Internacional (Cejil), Beatriz Affonso.

A decisão da corte é parte de um processo iniciado em abril de 2004, quando o Cejil e a Comissão Teotônio Vilela de Direitos Humanos encaminharam à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA pedido de medidas de emergência para garantir o direito dos internos. Segundo as entidades, os adolescentes eram submetidos a maus-tratos e torturas.

"A corte tem um poder de coerção muito maior do que a comissão. Em último caso, pode causar constrangimento político ao País", explicou Beatriz. Ela acredita que o governo do Estado não vai deixar a situação chegar a esse ponto.

E, justamente para evitar que a situação continue igual, uma das determinações prevê a elaboração periódica de um relatório sobre as medidas que o Estado está tomando para cumprir a ordem do tribunal.

O documento será entregue a cada dois meses e depois enviado às entidades denunciantes, para contestarem ou não os dados.

O secretário de Justiça, Hédio Silva Júnior, aposta que o primeiro relatório já anule as medidas provisórias. "Todas as determinações são baseadas em princípios que a Febem segue há tempos", alegou. Silva Júnior disse que já é feita a separação dos internos, como determina o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

Quanto às denúncias de maus-tratos, o secretário lembrou que, no ano passado, 1.751 funcionários foram demitidos por cometerem agressões. Em 2005, foram abertos 1.139 processos que investigam denúncias de maus-tratos. "Temos uma preocupação grande na contratação dos agentes educadores. Todos têm de ter formação superior, o que não nos livra de ter problemas", disse.

ATRASO

O Complexo Tatuapé, que hoje tem 1.300 internos, deveria ter sido desativado neste ano. Mas houve atraso na entrega das 41 novas unidades para onde seriam transferidos adolescentes. "Estamos trabalhando intensivamente para implementar as Febens, mas ainda há municípios que colocam obstáculos", justificou Silva Júnior.

A maioria das unidades ficaria fora da capital. Os jovens seriam levados para locais o mais próximo possível de onde vivem suas famílias. Com isso, o governo espera resolver o problema da superlotação do complexo. "Nossa intenção é que até no fim do ano que vem a Febem Tatuapé se transforme em um parque", disse o secretário.

Na sexta-feira, membros da Comissão Interamericana, das entidades denunciantes e do governo estadual devem se reunir mais uma vez para discutir a situação do complexo. Em janeiro, a Secretaria de Justiça envia o primeiro relatório à corte da OEA.

Segundo a diretora da Cejil, esta é a primeira vez que a corte determina medidas provisórias por causa de denúncias de maus-tratos contra crianças e adolescentes. "Existe um outro caso no Paraguai, mas que não chegou à corte ainda."

Em documento publicado no site da OEA, o juiz Antônio Augusto Cançado Trindade explica a preocupação sobre a gravidade das denúncias no Complexo Tatuapé e estranha que o caso tenha demorado tanto para ser aceito pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos. A primeira denúncia ao órgão foi feita em 2000. Além da Febem, a corte analisa outros três casos de violação dos direitos humanos no Brasil.