Título: IR da classe média deve bancar mínimo maior
Autor: Sérgio Gobetti
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/12/2005, Nacional, p. A6

O governo deve sacrificar a classe média, mantendo o congelamento da tabela do Imposto de Renda das pessoas físicas, para dar aumento um pouco maior do salário mínimo e tentar mostrar que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se esforçou para cumprir a promessa de dobrar seu valor real. Lula ainda não bateu o martelo, mas é provável que, com o reajuste, o mínimo fique entre os R$ 340 indicados pela equipe econômica e os R$ 360 defendidos pelo ministro do Trabalho, Luiz Marinho. O relator do Orçamento, deputado Carlito Merss (PT-SC), disse ontem que precisará cortar R$ 1,6 bilhão de outras despesas para chegar a um mínimo de R$ 350. O custo total do aumento de R$ 300 para R$ 350 fica perto de R$ 8 bilhões, mas parte já estava prevista na proposta orçamentária, que embutia a estimativa de um mínimo de R$ 321. Outra parte fora incluída extra-oficialmente no cálculo pelo relator, que trabalhava com o valor de R$ 340.

"É uma decisão que deve ser amadurecida, pois seria R$ 1,6 bilhão a menos para corrigir a tabela do IR", diz Merss. Na prática, os R$ 10 a mais de aumento no mínimo inviabilizam a correção das faixas de desconto do IR em 10% - o que faria o governo deixar de arrecadar R$ 2 bilhões. O mínimo beneficia 18 milhões de pessoas, enquanto a correção da tabela atinge 5 milhões. Esta última fatia da população já se sente prejudicada pela retenção de restituições do IR na malha fina - que chega a um nível recorde.

Sob o ponto de vista dos compromissos fiscais assumidos pelo governo, a opção do mínimo vai na contramão do que estabelece a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Nela, o governo se comprometeu a respeitar um limite para despesas correntes, como aquelas atreladas ao mínimo, e controlar a carga tributária. Para isso, argumentam os técnicos do Congresso, o governo deveria segurar o mínimo e oferecer um pequeno alívio no IR, e não o contrário.

No ano passado, o governo já gastou R$ 65,9 bilhões em benefícios assistenciais ou previdenciários atrelados ao mínimo. Para aposentados e pensionistas do INSS foram R$ 48,8 bilhões; para idosos e deficientes amparados pela Lei Orgânica da Assistência Social, R$ 7,5 bilhões, e para desempregados, R$ 9,5 bilhões. Esse gasto deve crescer 13% este ano, impulsionado pelo aumento do mínimo, e outros 15% no ano que vem, se prevalecer o valor de R$ 350.

"O mínimo é uma das melhores ferramentas para a distribuição de renda, mas dependemos do bom senso do Congresso para aprovar um valor maior", diz Merss. Para ele, a revisão de receitas do Orçamento abriu espaço de mais R$ 10 bilhões para as despesas em 2006, mas a soma de todas as demandas é duas vezes maior. Só o que os governadores reivindicam de ressarcimento pela desoneração das exportações chega a R$ 5,2 bilhões. Somados aos R$ 4,6 bilhões de custo adicional do salário mínimo, praticamente esgotma-se os R$ 10 bilhões. E a lista não para por aí: há despesas adicionais com pessoal, saúde e educação que não foram contabilizadas.