Título: A 3 dias da eleição, Evo volta a subir
Autor: Roberto Lameirinhas
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/12/2005, Internacional, p. A19

Às vésperas da eleição de domingo, o candidato cocaleiro à presidência da Bolívia, Evo Morales, sobe nas pesquisas de opinião. Segundo sondagem nacional publicada ontem pelo jornal El Deber, de Santa Cruz, ele tem 34,2% das intenções de voto, exatos 5 pontos porcentuais acima do segundo colocado, o ex-presidente conservador Jorge Tuto Quiroga. O terceiro colocado, o empresário Samuel Doria Medina, tem 8,9%.

Mas a pesquisa de El Deber - ainda que se ressalte que o histórico de confiabilidade das pesquisas bolivianas não é lá muito recomendável - mostra mais do que a simples liderança de Morales. O candidato do Movimento ao Socialismo (MAS) mantém uma tendência de alta nas quatro sondagens realizadas pelo Instituto Ipsos para o jornal.

Começou com 28,3%, subiu para 30,7%, foi a 32,8% e agora tem 34,2%. A tendência de voto para Quiroga se mantém estável na faixa entre 27,7% e 29,2% nas quatro pesquisas.

Para a maior parte dos analistas consultados pelo Estado na Bolívia, o melhor dos cenários para a institucionalidade do país seria uma vitória de Morales já no primeiro turno, com mais 50% dos votos.

Isso evitaria uma disputa no segundo turno, no qual o Congresso a ser eleito também domingo poderia contrariar a vontade das urnas e - por meio de uma composição política - dar a vitória ao segundo colocado nas eleições diretas.

"Se a campanha durasse mais uma semana, creio que Morales se aproximaria dos 50%", diz a cientista política Helena Argirakis. "Mesmo assim, a votação do MAS ainda deve crescer até domingo."

A pesquisa revela ainda que Morales está ganhando votos em Santa Cruz, a região mais desenvolvida da Bolívia e principal reduto eleitoral de Quiroga. Ele avançou 3,4 pontos em relação à última pesquisa, tomando o segundo lugar que era de Doria Medina no departamento (província). No Departamento de La Paz, Morales lidera confortavelmente com 48,4% das intenções de voto, para 18,9% de Quiroga. Na capital administrativa da Bolívia (a capital oficial é Sucre), o candidato do MAS é o preferido mesmo nos bairros de classe média alta, e às vezes por razões que vão muito além da simples ideologia ou preferência partidária.

Engana-se quem imagina La Paz apenas como uma cidade colonial terceiro-mundista com mercados ao ar livre em volta da inexorável "plaza de armas", presente na maior parte das cidades latino-americana.

Nos distritos de Sopocachi, Calacoto, San Miguel e outros bairros de La Paz há sinais de elegância européia, com restaurantes finos, cafés, automóveis e edifícios de luxo. Pois mesmo nessas áreas, onde os habitantes com traços indígenas são mais raros, a tendência de voto por Morales predomina.

"Não quero nem imaginar o que pode ocorrer aqui se Evo não for o presidente", diz Marú, que é argentina de Buenos Aires e não vota na Bolívia, mas está muito preocupada com a eleição. Ela é sócia do Le Bistrot, um pequeno e sofisticado restaurante de Sopocachi. Os 12 empregados do local vão votar no MAS. "Só a vitória de Evo pode dar estabilidade política por algum tempo e evitar a convulsão social que se prevê, caso ele não vença. Depois de outubro de 2003 (quando violentos protestos populares derrubaram Gonzalo Sánchez de Lozada), os turistas que freqüentam o restaurante desapareceram por vários meses. Queremos um governo que dê estabilidade ao país, qualquer que seja ele. Se Evo pode fazer isso, que seja."

Mas nem só o medo dirige os votos para o MAS em Sopocachi. Numa das esquinas do bairro, Mariana e Vania, duas estudantes da Universidad San Andrés, dizem que votarão em Morales pela vontade de mudança. "Já não podemos suportar mais a classe dos políticos tradicionais", diz Mariana. "A Bolívia precisa de mudanças políticas radicais e só Evo é capaz de implementá-las."

"Precisamos de uma classe política menos corrupta, que faça algo pelos bolivianos mais pobres para evitar uma explosão social no país", completa a colega Vania.