Título: SP tem seu 1.º vestibular com cota
Autor: Claudia Ferraz
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/12/2004, Vida &, p. A16

A primeira prova de uma instituição pública de Ensino Superior do Estado de São Paulo com sistema de cotas para alunos negros, pardos e indígenas que estudaram em escolas públicas foi realizada ontem em 12 cidades paulistas. A Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), antiga Escola Paulista de Medicina, foi a primeiro instituição pública de São Paulo a implementar o sistema e teve 1.026 candidatos cotistas para 27 vagas em 5 cursos. Eles também concorrem às 273 vagas gerais. Os exames vão durar três dias. Ontem, foram realizadas provas de conhecimento gerais de seis disciplinas: matemática, biologia, geografia, física, história e química. Hoje, será a vez de língua portuguesa, inglês e redação. Amanhã, haverá provas de conhecimento específico: biologia, química e matemática.

Segundo a Fundação Vunesp, que organiza as provas, os resultados serão divulgados no dia 3 de fevereiro.

Ao todo, o vestibular teve 13.835 candidatos inscritos. O índice de abstenção foi de 7%. Em São Paulo, dos 8.228 candidatos, 625 não compareceram. A cidade que teve menos ausência foi Sorocaba, com 4,1% - de 419 candidatos, apenas 14 faltaram.

As vagas para os cotistas em medicina são 11. Em enfermagem são 8. E fonoaudiologia, tecnologia oftálmica e ciências biomédicas têm 3 vagas cada uma.

Os vestibulandos ficaram felizes com a possibilidade de ingressar, de maneira facilitada, numa das maiores instituições de ensino superior do País.

A estudante Renata Aparecida Ferreira, de 24 anos, concluiu o ensino médio em 1999, mas não prestou vestibular na época, pois estava procurando um emprego. Hoje ela é técnica de enfermagem e conseguiu pagar o cursinho por causa do emprego.

"Estou estudando há quatro meses e acho ótimo ter essa oportunidade de poder crescer no mercado de trabalho e mudar a próxima geração. Em vez de ter a maioria de negros na profissão de faxineiros, poderemos nos tornar médicos", disse Renata, que prestou justamente para o curso de medicina.

DOIS LADOS

Assim como ela, o estudante Klaus da Silva Mendonça, de 19 anos, também acha que existem poucos negros no mercado de trabalho. "O sistema de cotas dá chance para os negros saírem da marginalização", disse. "Quero ser médico para trabalhar em um hospital e ajudar os carentes como eu."

Mendonça já foi aprovado no vestibular de uma faculdade particular, mas, caso não consiga entrar na Unifesp, não sabe como vai pagá-la. Ele espera passar no vestibular contando com a ajuda do sistema de cotas.

Ana Paula Rosa de Andrade, de 17 anos, também prestou para o curso de medicina. Na sua opinião, a idéia das vagas extras tem dois lados. "Ajuda porque tem menos concorrência entre os cotistas, mas, por outro lado, deveria ser igual para todo mundo. Eu acho que todos têm a mesma condição de passar se estudarem."

"É uma ajuda extra, mas deveria existir uma base melhor no estudo da escola pública, pois só o sistema de cotas não ajuda a população negra", afirmou Elídio Miguel Andrade, pai de Ana Paula. Ele é eletricitário e tem mais duas filhas, que também farão o vestibular nos próximos anos. "Eu não tenho como pagar para todas uma faculdade particular. Assim elas podem aproveitar essa facilidade", disse ele.

INSUFICIENTE

O pró-reitor de Graduação da Unifesp, Edmundo Baracat, explicou que o aumento de 10% no número de vagas da instituição para que ela possa adotar o sistema de cotas é um número significativo, mas não o suficiente. "O número de cotas não é pouco e melhora as desigualdades. Mas, para ajudar os alunos, é preciso aumentar a qualidade do ensino médio."

Em relação às cotas do ano que vem, Bacarat disse que haverá um fórum de discussão e o conselho universitário poderá ou não ampliar o sistema.