Título: 'Legislação política é pandemônio'
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Fonte: O Estado de São Paulo, 22/12/2004, Nacional, p. A5

Sarney defende reforma política para acabar com sistema "atrasado, que remonta ao século 19", e prega voto distrital misto

O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), voltou ontem a defender a aprovação da reforma política, para rever uma legislação "muito atrasada, que remonta ao século 19". Sarney disse que a demora nas mudanças causou um "pandemônio" na área política. Sarney criticou o atual sistema para eleger vereadores e deputados, via voto proporcional. A regra permite eleger políticos sem representatividade, graças um candidato "puxador de votos" na legenda. "Todos nós estamos habituados com essa coisa, que é um monstro. O voto proporcional uninominal só existe no Brasil."

Para o senador, essa regra faz com que o Brasil "esteja neste pandemônio da área política, sem jamais encontrar uma estrutura política que dê respaldo ao País". "Somos um País moderno na economia, na visão do fato social, mas sobre o ponto de vista da legislação política, a visão é muito atrasada e remonta ao século 19."

Um dos exemplos mais veementes da falta de representatividade decorrente do voto proporcional ocorreu na eleição de 2002. O candidato Enéas Carneiro se tornou o deputado mais votados da história do País, com 1.573.112 votos e com isso assegurou a seu partido, o Prona, outras cinco vagas na Câmara, beneficiando nomes praticamente desconhecidos dos eleitores, que obtiveram uma votação pífia.

Uma das dificuldades apontadas pelo presidente do Senado no encaminhamento da reforma política é acomodar as novas normas ao interesse dos parlamentares, sobretudo dos deputados.

"Eles (deputados) têm a idéia de que a reforma política vai, de certo modo, desmontar o seu esquema", alegou Sarney, voltando a defender a adoção do voto distrital misto no País. É assim chamado o sistema no qual o eleitor escolhe representantes de atuação circunscrita ao seu distrito eleitoral.

De acordo com os seus defensores, o voto distrital aproxima os eleitos da sociedade, além de tornar os partidos mais homogêneos, porque evita que os candidatos da mesma sigla se digladiem numa região eleitoral.

Em vez desse sistema, o projeto de reforma que está na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara prevê algo diferente - são as listas pré-ordenadas, escolhidas pelos partidos, sem restrição de distritos.

MANDATO

De acordo com o relator da reforma, deputado Rubens Ottoni (PT-GO), esse é um dos pontos polêmicos da proposta, juntamente com o financiamento público de campanha e o fim das coligações proporcionais.

Ottoni lembrou que os pontos em debate são infraconstitucionais, estão fora da Constituição, como forma de tentar facilitar a aprovação da matéria.

Segundo Ottoni, qualquer alteração no mandato do presidente da República, item que consta na Constituição, só seria possível diante de um grande acordo político no País, que até agora não teria dado sinal de vida.