Título: País perde milhões com a demora em liberar pesquisa
Autor: Lígia Formenti
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/01/2005, Vida &, p. A8

BRASÍLIA - A indústria farmacêutica pressiona o governo para apressar o processo de liberação de pesquisas nos centros brasileiros com medicamentos ainda em testes. Se o processo não for mais rápido, avisam, certamente o Brasil vai perder terreno para centros de pesquisa de outros países e, com isso, investimentos consideráveis. A mais recente queixa foi feita pelo presidente mundial da Novartis, Daniel Vasella, uma das maiores empresas farmacêuticas no mundo. Numa reunião nesta semana com o ministro da Saúde, Humberto Costa, Vasella sugeriu a revisão das regras e, como argumento para tal mudança, citou o potencial de investimento nesta área: US$ 300 milhões.

Somente a Novartis calcula que poderia ampliar dos atuais US$ 5 milhões para US$ 50 milhões os investimentos na pesquisa clínica brasileira (com pacientes voluntários). A diretoria da empresa afirma que os investimentos não são maiores justamente por causa da demora na liberação dos processos. O prazo varia de pedido para pedido, mas pode chegar a até nove meses. Em centros de ponta, o prazo médio é de três meses.

"Podemos ser mais rápidos, realmente. Mas nada pode ser feito de forma a colocar em risco a ética e a qualidade de vida dos pacientes voluntários nas pesquisas", afirmou Costa.

O diretor do departamento de Ciência e Tecnologia do ministério, Reinaldo Guimarães, garante que as regras brasileiras sobre ética em pesquisa são referência em todo mundo pela sua qualidade. "Várias medidas para aperfeiçoar o processo estão sendo tomadas, como capacitação de comitês de ética em pesquisa", disse. Em 2004, o ministério destinou R$ 3 milhões para capacitar e equipar 64 destes centros, o primeiro local onde os pedidos de pesquisa são avaliados (veja reportagem no alto da pág. A9).

Guimarães não nega a importância de o Brasil ser um centro escolhido para experiências com medicamentos. "Os resultados destes trabalhos podem ser aplicados a pacientes brasileiros", diz. O que não acontece com estudos feitos, por exemplo, somente na Europa. "Está comprovado que, muitas vezes, remédios têm variações de resultados de uma população para outra."

As pesquisas também favorecem a formação de profissionais e a qualidade de atendimento dos centros de pesquisa. O diretor do Instituto do Coração (Incor) do Hospital das Clínicas, em São Paulo, José Ramirez, lembra que, para conduzir pesquisas, muitas vezes indústrias destinam uma verba para contratação de pessoal e de equipamentos. "Todos saem ganhando, pois podemos usar profissionais contratados para outras atividades no hospital e os equipamentos para pacientes do serviço", conta.

Ramirez afirma que, somente em 2004, três contratos de pesquisa deixaram de ser formalizados no Incor com empresas internacionais por causa da demora na avaliação dos processos, o que representa 10% dos contratos internacionais. "É investimento desperdiçado. E uma chance jogada fora de ver profissionais se especializarem ainda mais."