Título: Para fugir de críticas, Lula recebe avião só em janeiro
Autor: Roberto Godoy
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/12/2004, Nacional, p. A5

O novo avião da Presidência da República está pronto ou quase isso. Já recebeu prefixo, FAB 2101, e as cores oficiais. A fuselagem é branca, com a inscrição Força Aérea Brasileira sobre uma barra azul. No leme há uma faixa verde e amarela e os códigos da matrícula. Faltam alguns detalhes da cabine de passageiros e da seção traseira. Trabalho de poucos dias com cabos e fios que só podem ser ligados agora, depois que o jato A-319 ACJ, construído na Alemanha, saiu da linha de acabamento, em Dallas, nos Estados Unidos e talvez esteja agora na França.

Por conta disso, o avião poderia chegar essa semana. No entanto, vai aterrissar em Brasília na segunda metade de janeiro, ou mesmo só em fevereiro. O motivo disso é que, no Palácio do Planalto, os assessores que cuidam da imagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva acham que é melhor esperar que o Natal passe.

Os conselheiros querem escapar das inevitáveis charges dos jornais e das brincadeiras de políticos da oposição, que aproveitariam a época para colocar o jato de dois motores no saco de presentes do Papai Noel para o presidente Lula.

A operação do Planalto foi favorecida pelas férias parciais dos metalúrgicos do consórcio europeu Airbus, que produz o A-319 em Hamburgo. As fábricas do grupo não param, mas as equipes trabalham em rodízio de folgas. O ritmo normal só volta no dia 13 do mês que vem.

SEM LUXO

O Airbus Corporate Jetliner A-319 da Presidência da República custou US$ 56.713.976,00 pagos em sete prestações. De certa forma, é um parcelamento antecipado: a entrada e a primeira fatura, no valor somado de US$ 16.234.198,20, foram quitadas em fevereiro. A última promissória, referente a US$ 2.539.763,00 vai vencer em março.

O arranjo interno do jato de alcance intercontinental - permite atingir sem escalas capitais como Paris e Washington - "é funcional e nobre, modular mas sem luxo algum", segundo Patrick Altona, diretor da Associated Air Center, a empresa texana encarregada da arquitetura interior do avião.

"De onde foi que tiraram essa idéia?", ele responde, rindo muito, quando perguntado sobre a banheira que haveria na suíte reservada ao presidente. "Nada disso. Foi instalado apenas um box, com ducha de alta pressão. O que existe é uma pequena extensão na entrada do compartimento. Erguida, represa a água e permite um banho de assento."

O FAB 2101 terá capacidade para 40 passageiros acomodados em poltronas de classe executiva, um pouco maiores do que as adotadas na classe econômica dos aviões usados nas linhas comerciais. Esse módulo pode ser trocado por outro com 20 ou 30 poltronas leito do padrão empregado na primeira classe das companhias aéreas.

REUNIÕES

Na ala de trabalho as acomodações são para oito ou dez pessoas. Há um sofá curvo, acompanhando o desenho da fuselagem e duas mesas retráteis. Uma com quatro lugares e outra com dois. Os assentos laterais giram em ângulo, para o corredor, permitindo reuniões. Monitores suspensos de cristal de plasma podem servir à exibição de DVDs ou observação de imagens recebidas via satélite. O sistema de som e de comunicação interna é digital.

Em praticamente toda a cabine é possível realizar a conexão de computadores pessoais. Na ala presidencial há um terminal de última geração.

O contrato com a Airbus Industries contém uma minuciosa cláusula de sigilo que proíbe o fabricante de revelar detalhes do equipamento. Por exemplo, o consórcio europeu não pode contar que foi montada a bordo uma mini-UTI para atender a eventuais emergências médicas.

Também não deve comentar que o FAB 2101 é uma unidade aerotransportada C3&I, central de comando, controle, comunicações e inteligência, por meio da qual o presidente da República pode manter o governo funcionando. Mais do que isso, permite ao chefe de estado administrar crises e manter contato com o mundo.