Título: Na escola não há mais alunos
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/01/2005, Internacional, p. A9

Bob Uppington, um professor aposentado da Inglaterra, veio a esta pequena vila de pescadores cingalesa devastada pelo tsunami para reencontrar 40 crianças. Mas ao visitar ontem um jardim de infância local e um campo de refugiados, ele não encontrou rostos que batessem com os retratos das crianças de 3 e 4 anos que visitara menos de duas semanas antes do pior desastre natural do Sri Lanka. "Meu estômago revirou", disse Uppington, diretor de uma instituição de caridade baseada na Grã-Bretanha que financia a escola D. J. Doodle. Ele faz viagens periódicas ao Sri Lanka para pagar os funcionários. "Simplesmente não sabemos quantos morreram."

As crianças estavam em férias quando o tsunami atingiu o país, mas muitas moravam perto da escola, que ficou semidestruída.

Moradores da vila com rostos sombrios cumprimentavam Uppington enquanto ele examinava os danos no jardim de infância de Karaitivu, no distrito oriental de Ampara, o mais atingido pelo tsunami.

Embora as ondas tenham reduzido as casas a montes de escombros na praia, a poucos metros dali as paredes da escola ficaram praticamente intactas, ainda com fotografias das crianças.

"Muitas crianças morreram, sir", disse Thangeswary Yoham, de 42 anos, a Uppington.

"Cerca de 200 crianças pequenas morreram deste lado", acrescentou ela, apontando para o mar.

A D. J. Doodle, rodeada de palmeiras, é uma das escolas no Sri Lanka e no Nepal que a instituição de Uppington, SHIVA Charity, ajuda a patrocinar. Sua manutenção custa US$ 115 por mês.

Uppington visitou a escola em meados de dezembro para pagar o professor e ver as crianças.

"Acho que vamos derrubá-la e reconstruí-la", disse Uppington, de 60 anos, de Bristol.

"No momento, ela é uma espécie de memorial das crianças mortas." Depois de vasculhar a praia cheia de escombros, ele contou ter encontrado outra escola destruída - e disse que planeja reconstruí-la num terreno vizinho.

Moradores disseram que milhares de pessoas morreram na vila e arredores. Muitas mulheres e crianças que não puderam fugir rápido o bastante foram arrastadas pela água ou esmagadas sob escombros.

Perto da praia, alguns homens estavam reunidos em torno de uma pilha de escombros, cobrindo a boca com um pano. Com tanta devastação, é impossível remover todos os corpos. Os remanescentes estão sendo queimados no local.