Título: O custo da reconstrução
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Fonte: O Estado de São Paulo, 06/01/2005, Notas & Informações, p. A3

U m dia depois da posse, o prefeito José Serra assinou oito decretos que definem os objetivos imediatos de seu governo - a redução de despesas. A administração tucana quer diminuir de R$ 600 milhões por ano os gastos com custeio. É a única saída para uma Prefeitura que está com as finanças em desordem, deve quase R$ 30 bilhões e precisará fazer sacrifícios imensos para se enquadrar nos limites de endividamento determinados pelas resoluções do Senado e pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), a partir de abril.

No início do ano eleitoral de 2004, a ex-prefeita Marta Suplicy prometeu deixar vazios os cofres da Prefeitura - e cumpriu a palavra. Gastou tudo - e mais alguma coisa - em obras eleitoreiras, contratações e megaconcessões, com o objetivo de se reeleger. Para cumprir a promessa de revolucionar o transporte, assinou contratos bilionários com empresas de ônibus que, na licitação, apresentaram cartas de fiança falsificadas. Para acabar com o cartel do lixo, firmou contratos grandiosos com as mesmas empreiteiras de sempre, apesar das denúncias de fraudes no processo de licitação. Fez os vistosos CEUs sem deixar em caixa recursos para mantê-los. Assim ocorreu com os piscinões que, sem manutenção, se transformaram em lixões a céu aberto.

Marta Suplicy gastou muito e mal. Agora, o novo secretariado terá até o dia 31 para rever todos os contratos de valor igual ou superior a R$ 1 milhão, e até o fim de março para renegociá-los. As licitações estão suspensas. Do orçamento municipal de R$ 15,2 bilhões, R$ 4 bilhões destinam-se ao pagamento de serviços - e são essas despesas que a nova administração reverá.

Em todas as secretarias, os cargos de confiança serão reduzidos em 15% e passou a ser do prefeito a responsabilidade exclusiva pela nomeação ou exoneração de servidores nesses postos. No prazo de 180 dias será concluído o mapeamento dos cargos de confiança ocupados por 11 mil funcionários comissionados, que custam à Prefeitura R$ 500 milhões anuais. A medida deve resultar em economia anual de R$ 75 milhões.

Um levantamento da situação dos 193 mil servidores ativos e aposentados será realizado por meio de recadastramento obrigatório. Com isso pretende-se apurar irregularidades, como pagamentos de aposentadorias e benefícios a funcionários fantasmas. Segundo o secretário municipal de Finanças, Mauro Ricardo Costa, há pessoas recebendo duas vezes, com dois CPFs em uma única conta bancária. Até que o recadastramento seja feito, ficará suspensa a convocação dos aprovados em concursos públicos e a contratação de mão-de-obra terceirizada.

O prefeito determinou ainda a adoção do pregão eletrônico para as compras, sistema que inclui o leilão reverso, pelo qual fornece ao governo quem oferecer produtos e serviços ao menor custo e de melhor qualidade.

Também foi instituído um grupo de trabalho para levantar as dívidas da Prefeitura, já que, depois que se tornou prática comum o cancelamento de empenhos e outras manobras contábeis, a dívida de curto prazo é uma incógnita.

O objetivo do prefeito José Serra é descobrir o que restou da Prefeitura depois do "governo da reconstrução", como se definia a administração petista. Nas ruas, a incompetência no gasto do dinheiro público está às vistas. O Túnel Jornalista Fernando Vieira de Mello, por exemplo, construído para melhorar a fluidez do tráfego, se transformou em piscinão na primeira chuva; e os piscinões não passam de amplas escavações que, sem manutenção, estão assoreadas, tomadas pelo mato e lixo e são incapazes de represar a água das chuvas.

A recuperação desses piscinões, a limpeza de córregos, a manutenção de áreas verdes e outros tantos serviços não podem esperar. Secretários municipais têm convencido algumas empresas a voltar ao trabalho, embora estejam há meses sem receber. Tentam empreender um amplo mutirão, para amenizar o quanto for possível, e em prazo recorde, os problemas mais prementes da cidade, como os alagamentos e enchentes característicos da estação. "Tentamos estimulá-los a realizar um esforço nesta época do ano, mesmo sem ter dinheiro em mãos", afirmou o secretário de Coordenação de Subprefeituras, Walter Feldman. A tal ponto foi reduzida a cidade, após uma sucessão de administrações ruinosas que começou com Paulo Maluf, continuou com Celso Pitta e esperamos que tenha terminado com Marta Suplicy.