Título: Governos estouram contas e Congresso quer mexer na Lei Fiscal
Autor: Sérgio Gobetti
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/01/2005, Nacional, p. A6

O Senado prepara-se para discutir e promover mudanças nas resoluções sobre os limites de endividamento da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Tramitam no Congresso mais de uma dezena de projetos que pretendem alterar a lei. De acordo com o presidente da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), senador Ramez Tebet (PMDB-MS), responsável pelo ordenamento desse debate, é preciso encontrar solução para a grave situação financeira de Estados e municípios. "Nada é mais forte do que a realidade dos fatos", diz o peemedebista, em referência à fórmula de fazer ajustes sem ferir a lei. "Quando se quer, se encontra alguma maneira de fazer."

A posição do presidente da CAE não é unanimidade entre os senadores, mas reflete o pensamento da maioria. "O Senado representa os entes da federação. É obrigação estudarmos com todo o carinho as propostas de ajuste."

Além da Prefeitura paulistana, os governos dos Estados de São Paulo, Rio Grande do Sul e Alagoas estão diante de tarefa quase impossível: economizar R$ 24 bilhões até 30 de abril para entregar à União e reduzir sua dívida na proporção definida por resolução do Senado que regulamentou a Lei Fiscal. O governo de São Paulo precisa fazer a maior economia em número absoluto (R$ 10,8 bilhões) e o de Alagoas, o maior esforço em termos relativos (65% da receita líquida).

Pela resolução 40 do Senado, de dezembro de 2001, os Estados não podem acumular dívida superior a 2 vezes sua receita e os municípios têm limite de 1,2 vez. O governo que, na época da resolução, já estava acima desses limites ganhou 15 anos para eliminar o excedente, em proporção de um quinze avos (1/15) por ano (casos da Prefeitura de São Paulo e governo gaúcho). Já quem estourou o limite depois da resolução (Alagoas e São Paulo), em 2002, continuou com só um ano para se enquadrar.

Em tese, prazos de redução do endividamento deveriam estar sendo observados desde 2003, mas nova resolução do Senado, de novembro daquele ano, postergou-os até 30 de abril de 2005 com base em artigo da LRF que permitia flexibilidade "na hipótese de se verificarem mudanças drásticas na condução das políticas monetária e cambial". É o que, na interpretação de senadores, ocorreu em 2002 durante a crise econômica nas eleições presidenciais.

Na época, a desvalorização do real e a aceleração da inflação fizeram disparar o indexador das dívidas - o IGP-DI - em velocidade muito superior à das receitas. Passados dois anos, entretanto, a Prefeitura de São Paulo e os três Estados ainda não conseguiram recuperar sua receita para que hoje estivessem no ponto de redução da dívida exigido pela resolução 40.

INJUSTIÇA

"Quem não se enquadrou é porque não fez o esforço necessário", avalia o senador Rodolfo Tourinho (PFL-BA), contrário a qualquer revisão das regras atuais. "Sou contra qualquer renegociação, pois é uma injustiça contra os que se enquadraram." Exemplo de Estado que conseguiu se ajustar, apesar da grave situação financeira, foi Minas, que em 2001 acumulava dívida 2,34 vezes maior do que sua receita e hoje conseguiu reduzi-la para 2,29. Já o Rio Grande do Sul viu sua dívida passar de 2,51 para 2,83 vezes sua receita nos últimos três anos.

No mesmo período, a dívida da Prefeitura de São Paulo pulou de 1,84 para 2,33 vezes sua receita, enquanto a do governo do Estado passou de 1,97 para 2,23. "Não há a menor hipótese de nos ajustarmos (caindo para uma relação de 2) até o final de abril. Vamos ter de falar com o Tesouro", afirma o secretário da Fazenda do Estado de São Paulo, Eduardo Guardia.

Uma das hipóteses para resolver o problema dos três Estados e da Prefeitura de São Paulo seria prorrogar de novo o prazo de enquadramento das dívidas, mas há controvérsia sobre a possibilidade e abrangência desse tipo de fórmula. "Tudo depende da boa vontade da área econômica", diz Tebet.

Segundo ele, o governo tem maioria na CAE e qualquer mudança dependerá de aval do Ministério da Fazenda, sempre relutante. Na área política do governo, especialmente entre possíveis candidatos a governador em 2006, há amplo apoio à idéia de alterar prazos e limites de endividamento. A questão é que fórmula adotar para não dar a impressão de que a Lei Fiscal está sendo flexibilizada.