Título: Para Suplicy, é erro achar que PT ganha se Serra for mal
Autor: Mariana Caetano
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/01/2005, Nacional, p. A7

Instalado em Washington para 40 dias de pesquisas no Centro Woodrow Wilson de Estudos Internacionais, o senador Eduardo Suplicy (PT-SP) fez um apelo para que o Senado e o governo Lula encontrem uma saída para a dívida de quase R$ 30 bilhões da Prefeitura de São Paulo. A cidade pode perder repasses federais, entre outras sanções, se até maio não quitar R$ 7 bilhões do débito. O esforço deve ser apartidário, insistiu o senador, depois de mandar um recado ao grupo da ex-prefeita e ex-mulher Marta Suplicy (PT): "Há pessoas no partido que parecem ter a visão de que será melhor para o PT que não ajudem o governo José Serra a se dar bem. Não vejo assim." Em maio, a Lei Fiscal obriga a Prefeitura a pagar à União R$ 7 bilhões, o que é impraticável. Como se resolve o problema? O prazo deve ser outra vez adiado?

A prefeita Marta Suplicy já vinha alertando para a necessidade de um entendimento, tendo em conta que as exigências estabelecidas na negociação do governo FHC com o prefeito Celso Pitta implicavam o pagamento de 13% da receita líquida de cada mês. Isso limitava demais os investimentos públicos municipais. José Serra parece ter opinião semelhante. Ao lado de um significativo esforço de ajuste de despesas é natural que ele apresente um plano para viabilizar as finanças do município. Na medida em que esse entendimento requer tratamento eqüitativo para os demais municípios e houver necessidade de apreciação pelo Senado de projetos de resolução que viabilizem este caminho, creio que haverá boa vontade dos senadores para examinar o assunto.

Há outros municípios em crise, com prefeitos sujeitos às penalidades da Lei Fiscal. A lei lhe parece, hoje, eficaz?

A Lei de Responsabilidade Fiscal tem muitos aspectos positivos, induzindo maior responsabilidade dos prefeitos. Mas ela precisa ser realista em sua aplicação. Deve ter critérios equilibrados para sua execução.

Se as regras para o limite de endividamento foram mudadas outra vez, a Lei Fiscal não estaria sendo posta em xeque?

Qualquer adaptação que vise ao bom senso e ao interesse publico, sem retirar o aspecto disciplinar, pode ser um passo aceitável.

Que adaptação o sr. admite?

Vários pontos poderiam ser aprimorados. A solução pode vir do adiamento do limite ou mesmo da alteração do limite. A flexibilização deve ser fruto de negociação do governo com os Estados e municípios em crise.

Então o sr. acredita que São Paulo não será penalizada ?

Acho que não, mesmo Serra sendo prefeito. O clima de guerra não é bom para ninguém. Há pessoas no partido que parecem ter a visão de que será melhor para o PT que não ajudem o governo Serra a se dar bem. Não vejo assim.

Quem?

É algo que sinto no ar...

Vem do grupo da ex-prefeita?

Se for este o sentimento deles, minha recomendação é mudar a postura, que considero contraproducente para seus próprios objetivos.

O que o sr. achou da eleição de Roberto Tripoli na Câmara? O PT e a prefeita agiram corretamente?

Em 1.º de janeiro não consegui voar de Cuiabá para São Paulo porque o vôo fora suspenso. Assim, avisei ao Arselino Tatto que, diante do empate - a votação estava 27 a 27 -, considerava importante um entendimento que permitisse a eleição de Luiz Eduardo Greenhalgh para a presidência da Câmara. Como PT e PSDB têm 13 vereadores cada, pareceu-me bom que cada partido pudesse ter a presidência nos próximos quatro anos. Tenho de respeitar, porém, a escolha feita. Tripoli foi um dos vice-presidentes quando presidi a Câmara em 1989 e 1990. Conhece bem a Casa. Espero que possa realizar um bom trabalho.

Como deve atuar a bancada petista na Câmara? As conquistas da gestão Marta estão em jogo?

A bancada deve estar sempre atenta ao que estiver ocorrendo, sem espírito de guerra e sem impedir que o prefeito faça uma boa gestão. Que tenha sempre sugestões sobre o que pode ser feito para aperfeiçoar os bons projetos iniciados na gestão Marta. Serra disse que iria continuar as principais realizações dela. Já o informei de minha disposição de colaborar com tudo que for a favor da maior transparência e defesa de interesse dos paulistanos. Na área dos programas sociais, disponho-me a dialogar com ele e com o secretário Floriano Pesaro. Já conversei muito com Pesaro quando ele coordenava o Bolsa-Escola com o ministro da Educação, Paulo Renato.

Como avalia o cenário do PT para de 2006? O senhor recomendaria a Marta ser candidata ao governo do Estado? E o sr., quer ser?

No plano federal, tenho convicção de que o presidente Lula será candidato à reeleição, na medida em que estiverem se consolidando os resultados positivos de sua administração. Há três semanas, no jantar com a bancada do PT no Senado, disse a Lula que o apóio desde já - diferentemente do ocorrido em 2002, quando fui pré-candidato à Presidência. Nem ele nem eu apoiamos o instituto da reeleição, mas hoje ele está na Constituição. No plano estadual, acho positivo que o PT tenha bons valores para a disputa. Marta foi ótima prefeita, com iniciativas importantes como os CEUs, o bilhete único, os corredores de ônibus, o programa de renda mínima. Teve aprendizado notável e pode refletir sobre como poderia ter sido ainda melhor. É legítimo que possa disputar o governo. Aloizio Mercadante e João Paulo Cunha também têm muitas qualidades. Felizmente, o PT tem um processo democrático de fazer prévias. No momento, disponho-me a ser outra vez candidato ao Senado, se for a vontade do partido.

O senhor defende a realização de prévias em São Paulo?

É o método mais democrático. Lembro que em 2002 o PT foi o primeiro partido na história do Brasil a realizar uma prévia entre os filiados para escolher o candidato a presidente. 172 mil compareceram, tive 15,6% e Lula 84,6%. A partir daquele momento passei a apoiá-lo com toda a energia.

Como o sr. vê, no futuro, as relações entre PT e PSDB?

Têm sido muitos os momentos, no Senado, em que nós, do PT e do PSDB - em que pesem os naturais curtos-circuitos -, soubemos dialogar para aperfeiçoar projetos. Também é mais que natural que o presidente do PT trate os governadores e prefeitos do PSDB com isenção. O presidente Lula tem meu apoio para tratá-los do mesmo modo como trata os do PT.

Ficou alguma mágoa entre o sr. e a prefeita após a eleição? Que recomendação o sr. lhe faria hoje?

Falei algumas vezes com ela após a eleição, mas, como estou em Washington, não tivemos uma conversa mais profunda sobre política. No dia 7, quando morreu a mãe dela, dona Noêmia, telefonei dizendo a ela e seus irmãos o quanto gostaria de estar junto. Marta sabe que sempre pode conversar comigo sobre os caminhos da política e do que for o melhor para nossos filhos e para o Brasil.