Título: Chico total na galeria
Autor: Lauro Lisboa Garcia
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/01/2005, Caderno 2, p. D1

Colégio Santa Cruz, São Paulo, início dos anos 1950. Vem dali uma das imagens mais preciosas de Chico Buarque - O Tempo e o Artista, que começa hoje em São Paulo, no Sesc Pinheiros, com exposição de fotos, documentos, manuscritos, shows musicais, filmes baseados em suas obras (Estorvo, Benjamim e Ópera do Malandro) e uma peça de teatro, Os Saltimbancos. Com curadoria de Zeca Buarque Ferreira, sobrinho de Chico, o evento vem do Rio, onde esteve no ano passado por ocasião dos 60 anos do compositor e escritor, traz fotos inéditas e, entre outras curiosidades, um texto de Chico sobre São Paulo, quando recebeu o título de cidadão paulistano em 1967. Nesse texto ele cita composições suas daquele período que são de inspiração paulistana, como A Banda e Pedro Pedreiro. Fundado por padres canadenses em 1952, o Santa Cruz tem papel importante na formação de Chico. Foi ali que ele escreveu suas primeiras crônicas, no jornal da escola, começou a se destacar no futebol e subiu ao palco para cantar pela primeira vez. Nascido no Rio, Chico veio com a família para São Paulo com apenas 2 anos. Entre 1953 e 1954, os Buarques mudaram-se para a Itália. Dessa época, Chico guardou um bilhete de uma professora, escrito em inglês, em que, além de destacar o lado levado do menino, ela dizia: "Você vai crescer e espero um dia entrar numa livraria e encontrar um livro de F.B. de Holanda". Esse bilhete também está na exposição. Como diz Zeca, não foi à toa que ele despertou nela essa impressão. Naturalmente teve bons motivos.

Grande parte da mostra é dedicada à infância e à adolescência de Chico, quando morou nas Ruas Haddock Lobo, Buri e Henrique Schaumann, em São Paulo. A foto dele com os colegas bagunçando a sala de aula é indizível. Os outros conjuntos de fotos são dedicados ao futebol, uma de suas notórias paixões, ao seu envolvimento em questões políticas, especialmente no período do regime militar, a relação com parceiros e intérpretes - como Nara Leão, Gal Costa, Maria Bethânia -, além de seus mestres.

Como se sabe, Chico é avesso a homenagens, acha cabotino. Coerente com a atitude do artista - cuja importância para a cultura nacional é evidente ao extremo -, Zeca evitou fazer "um culto à personalidade, que a isolasse do contexto, até por muito respeito a ele". "Pensando historicamente, quis que a exposição afirmasse o que significa Chico Buarque na música brasileira." Daí a presença, nos espaços da exposição, dos sons que Chico ouvia e que o influenciaram, como Ismael Silva, Dorival Caymmi, Noel Rosa, cujas imagens estão no segundo bloco da exposição.

Os shows de Toquinho, Francis Hime, Cida Moreira e Renato Braz seguem a mesma trilha, não apresentando apenas as canções de Chico, mas dos que o formaram e marcaram seu tempo. Mônica Salmaso, o Quarteto Maogani e Teresa Cristina devem se apresentar na série em fevereiro. É quando também serão exibidos programas de TV, como o Ensaio, de Fernando Faro, sobre o compositor. "Acho que vai ser bem completa e bacana, para quem gosta de Chico", diz Zeca. E quem não gosta?