Título: Reforma assusta universidade privada
Autor: Gabriel Manzano Filho
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/01/2005, Nacional, p. A5

Divulgado no fim do ano passado, e recebido com enorme desconfiança por líderes estudantis - que o consideram "um projeto do Banco Mundial" -, o anteprojeto de reforma universitária começa a receber, também, críticas dos setores do ensino superior particular. "É um projeto claramente preconceituoso em relação ao ensino privado", resume o professor Gabriel Mário Rodrigues, presidente da Associação Brasileira de Mantenedores do Ensino Superior - função que ele combina, agora, com a de coordenador do Fórum Nacional de Livre Iniciativa na Educação. "Tira completamente a autonomia das instituições privadas", acrescenta Rodrigues, que tem participado de vários encontros para avaliação dos 100 artigos do anteprojeto. Defendido vigorosamente pelo ministro da Educação, Tarso Genro, o documento - que começará a tramitar no Congresso em fevereiro - introduz a autonomia universitária, volta a propor o ciclo básico, e propõe prioridades sociais que muita gente, na área educacional, considera suspeitas. Uma dessas prioridades, no artigo 4.º, diz que a educação superior adotará, entre outros, "critérios universais de renda ou específicos de etnia", na seleção dos futuros universitários.

"Já contamos com cerca de dez entidades do segmento do ensino superior particular", adianta o professor Eduardo Storópoli, reitor da Uninove e presidente da Associação Nacional dos Centros Universitários (Anaceu). "Até meados de fevereiro deveremos ter entre 20 e 25 entidades debatendo no Fórum", diz. Esse foi o prazo que o ministro Tarso Genro deu para que as diversas entidades debatam os artigos e apresentem suas sugestões para o anteprojeto.

CONTRAMÃO

Para Rodrigues, o documento "tem já um sério ranço ideológico". Mas o mais grave é que "ele ignora as tendências que vêm se implantando no ensino superior em todo o mundo, tanto no conteúdo quanto no formato das organizações". Segundo ele, "percebe-se que há uma campanha (no texto do Ministério da Educação) contra a iniciativa privada na área da educação".

Embora técnicos do ministério argumentem que, até aqui, o texto foi elaborado com ajuda de diferentes setores da sociedade, ele não vê dessa forma. "Essa é a justificativa para defender as propostas. Mas eles não parecem levar em conta que o grande objetivo dessa atividade é a formação de capital humano para o País. Eles parecem não ter a visão de que o País precisa disso para se desenvolver", acrescenta.

Por isso, dirigentes do ensino superior privado decidiram convocar especialistas de outros Estados para discutir o documento e redigir contrapropostas. "Dentro de algumas semanas vamos ter nossa contraproposta", adianta Rodrigues. "Estamos ainda avaliando área por área. Vamos interagir com o Executivo nesse debate", promete Storópoli.

O que preocupa os dirigentes do setor privado é "o viés ideológico", segundo ele, presente em vários artigos. Um deles, por exemplo, estabelece entre as finalidades para a educação superior a "aplicação de políticas e ações afirmativas"... "por critérios universais de renda ou específicos de etnia, com vistas à inclusão social dos candidatos a ingresso em seus cursos e programas".

Outro item propõe "o atendimento das necessidades (...) em razão dos interesses nacionais, especialmente com vista à redução de desigualdades sociais e regionais e ao incentivo ao desenvolvimento sustentável, em termos ambientais e econômicos". Fala-se ainda em "gestão democrática, com "organização colegiada das instituições", para promover "a cooperação das categorias integrantes" de suas comunidades.