Título: Área econômica quer evitar 'artificialismos'
Autor: Sheila D'AmorimVera Rosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/01/2005, Economia, p. B1

A ampliação do prazo para que os exportadores possam trocar os dólares recebidos no exterior por reais como defende o ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan, encontra fortes resistências na equipe econômica porque é vista como uma intervenção no câmbio. A avaliação é que uma medida nesse sentido pode passar a idéia ao mercado de que o governo está "criando artificialismos" num momento em que as moedas no mundo todo estão se ajustando em relação ao dólar. Apesar de reconhecerem como legítima a preocupação do ministro em relação ao impacto que a cotação mais baixa do real em relação ao dólar pode ter nas vendas de produtos brasileiros ao exterior, técnicos do governo contra-argumentam dizendo que "o País só está acompanhando um movimento mundial". Segundo esses técnicos, não houve nenhuma alteração significativa no cenário doméstico que justifique uma apreciação brusca do real. O ajuste recente veio por causa da dúvidas sobre o comportamento da economia americana, que nos últimos anos tem elevado os gastos em comparação com as receitas públicas e produzido déficits também nas transações comerciais e financeiras com o resto do mundo. "Ninguém sabe como o governo Bush irá resolver essas questões, e isso tem feito o dólar se desvalorizar", destaca o diretor de análise de risco do BES Investimento, Carlos Guzzo. Para ele, uma prova de que a apreciação do real não está sendo criada internamente é o fato de a moeda brasileira não apresentar o mesmo comportamento em relação ao euro. Como boa parte do desempenho econômico positivo em 2004 é creditada ao aumento das exportações brasileiras, área vinculada diretamente a Furlan, técnicos da área econômica preferem interpretar as críticas do ministro à política cambial como uma "preocupação legítima" do ministro, que estaria de olho no crescimento econômico neste ano e em 2006. SIMPLIFICAÇÃO Por enquanto, as medidas em estudo na equipe econômica não resolvem as inquietações do ministro Furlan. A proposta de alterações nas regras cambiais em vigor preparadas pelo Banco Central não influenciam a cotação da moeda. Ao contrário, apenas reafirmam o sistema flutuante e tentam eliminar a burocracia que foi mantida, apesar de os mercados de câmbio terem sido unificados na prática em 1999. Na época, os dois segmentos de câmbio existentes (livre e flutuante) foram interligados e os bancos puderam juntar as operações realizadas numa espécie de "caixa único". Com isso, os dólares que ingressavam no País em razão das operações comerciais e eram relacionados no segmento livre compensavam as saídas efetuadas pelo flutuante, seja por causa do movimento de turistas em viagem ao exterior ou remessas de brasileiros para fora do País. As cotações diferenciadas nos dois mercados foram extintas, mas os registros continuaram sendo feitos de forma separada. As mudanças sugeridas pelo BC simplificam essas operações, mas não tiram do governo o poder de controlar os fluxos cambiais nem acabam com a identificação das pessoas envolvidas nas transações cambiais. Assim, pagamentos de empréstimos contraídos no exterior ou realização de investimentos poderão ser feitos de forma mais simples e automática mas o governo continuará sabendo a origem e quem está por trás da operação. "Isso não interfere na cotação. Apenas dá mais agilidade, transparência, reduz burocracia e custo no processo", avalia um técnico do governo.