Título: Crítica de Furlan irrita Lula e Palocci
Autor: Sheila D'AmorimVera Rosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/01/2005, Economia, p. B1

As críticas do ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Luiz Fernando Furlan, à política econômica irritaram o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ministro da Fazenda, Antonio Palocci. O que mais incomodou o governo foi o ataque de Furlan à condução da política cambial e o fato de ele se intitular porta-voz dos empresários, dizendo estar no governo para aprender como funciona o setor público antes de voltar para a iniciativa privada. Logo cedo, diante do constrangimento que causou sua entrevista ao Estado, Furlan apressou-se em desfazer o mal-estar. Aproveitou uma reunião de Lula com a coordenação política do governo, no Palácio do Planalto - convocada para discutir a criação da Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual (Ancinav) - para afirmar que foi mal interpretado. "O título da matéria do Estado não expressa o que eu quis dizer", defendeu-se o ministro, numa referência à chamada da reportagem "Furlan ataca câmbio e meta de inflação". Na tentativa de descontrair o ambiente, o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP) - contrário à meta de inflação fixada atualmente pela equipe econômica e defensor de uma intervenção no câmbio -, ironizou: "Ué, mas o título está bom!". Ao seu lado, Palocci sorriu e concordou: "Eu também acho". Ao longo do dia, Furlan procurou deixar claro que não criticou o sistema de metas de inflação, mas apenas explicitou na entrevista sua tese de que os juros altos não são eficientes para combater uma inflação alimentada por preços administrados. O presidente, que comandava a reunião, não fez nenhum comentário publicamente. Em conversas reservadas, porém, tanto ele como Palocci manifestaram seu descontentamento. A estratégia do governo é evitar polêmica pública com Furlan, considerado um aliado da equipe econômica, e não um adepto do "fogo amigo". O aparente clima de tranqüilidade diante das declarações não foi suficiente, no entanto, para abafar a irritação de integrantes da equipe econômica, que consideraram as declarações "absolutamente inadequadas e infelizes". "Imagine o Armínio Fraga ou um diretor do Banco Central dizendo que estava no cargo como porta-voz do setor financeiro por um período sabático para depois voltar para a iniciativa privada", criticou um integrante do governo, referindo-se ao ex-presidente do BC. "Duvido que estaria no cargo no dia seguinte." O interlocutor ressaltou, porém, que se trata de um problema do presidente admitir ou não ter em sua equipe um ministro que ataca políticas endossadas pelo próprio Lula, como a de câmbio flutuante e de metas de inflação. O presidente do PT, José Genoino, preferiu ficar fora da polêmica. "Eu não quero entrar nessa confusão. Já tenho a minha banquinha de egos, ciúmes e mágoas para administrar", brincou. Já o presidente da Comissão Mista de Orçamento, deputado Paulo Bernardo (PT-SP), tentou pôr panos quentes. "A entrevista é a fala de um ministro do Desenvolvimento, que tem preocupação com o comércio exterior e pensa diferente de quem está no centro da política monetária", amenizou Bernardo. "Não se trata de uma fala impertinente."