Título: UE apela e atrasa mudança dos subsídios ao açucar
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/01/2005, Economia, p. B6

A União Européia (UE) atrasou em pelo menos mais três meses o início do debate da reforma de seus subsídios ao açúcar, condenados em 2004 pela Organização Mundial do Comércio (OMC) a pedido do Brasil. Ontem, como previsto, os diplomatas de Bruxelas enviaram à OMC um pedido de apelação contra a decisão que deu a vitória ao Itamaraty. Ao arrastar a disputa, disseram produtores europeus entrevistados pelo Estado, Bruxelas ganha mais tempo para negociar internamente como fazer a reforma de um sistema que existe desde 1968. Para a agência internacional Oxfam, a decisão da UE de atrasar o processo é "vergonhosa" e uma condenação é "inevitável". Em 2004, Brasil, Austrália e Tailândia entraram com queixa na OMC contra os subsídios europeus. Segundo a OMC, a Europa pôs de forma ilegal no mercado internacional 2,8 milhões de toneladas de açúcar subsidiado, afetando as exportações brasileiras. O Órgão de Apelação da OMC vai rever o caso e dar uma resposta final até 13 de abril.

A disputa ocorre em torno da obrigação da UE de reduzir os subsídios. Os europeus teriam direito a exportar 1,3 milhão de toneladas de açúcar subsidiado. Em 2001, o volume foi de 4,7 milhões de toneladas. Segundo o governo brasileiro, se o excedente da UE fosse retirado do mercado, o País aumentaria as exportações em US$ 400 milhões.

A OMC concordou que o limite foi ultrapassado. Mas, segundo documento obtido pelo Estado, em que a UE apresenta seu recurso, seis pontos são questionados na decisão da OMC. Entre eles, o fato de que a quantidade de açúcar exportada com subsídios não superou o limite ditado pelas regras internacionais. Para a UE, as decisões foram tomadas com base em princípios "errôneos".

A segunda parte da vitória do Brasil refere-se ao açúcar importado pela UE do grupo de países pobres ACP (África, Caribe e Pacífico). O governo questionava a 'reexportação' de 1,6 milhão de toneladas que compra desses países. Com o mercado interno saturado pela superprodução gerada pelos subsídios, a UE não tem opção senão desviar o produto para outros mercados, afetando de novo o Brasil. O País está confiante que a nova avaliação não mudará o resultado da arbitragem.

Segundo Bruxelas, as autoridades vão aguardar a palavra final na OMC para formular uma proposta de reforma, que será debatida entre os 25 países. Um rascunho foi preparado em 2004, mas foi criticado por países como a Espanha ou a França. "A reforma do regime do açúcar vai ter de esperar", afirmou Jean-Louis Barjol, diretor-geral do Comitê Europeu de Fabricantes de Açúcar. Segundo ele, enquanto a OMC revê o caso, os produtores europeus farão um "intenso lobby" em Bruxelas para influenciar na decisão final da UE sobre os subsídios.

As primeiras reuniões para debater a reforma estão previstas para junho e devem se prolongar por meses. Para a Oxfam, a reforma é inevitável. "A data de validade desse sistema injusto já acabou", disse Jo Leadbeater, chefe da Oxfam em Bruxelas. Segundo ele, seis empresas européias, sozinhas, recebem cerca de US$ 1 bilhão em subsídios.

A OMC recebeu ontem outra queixa contra os europeus. Agora, são os americanos que pedem a formação de um comitê de arbitragem para avaliar as regras aduaneiras da UE. Os Estados Unidos alegam que os europeus, apesar de serem um bloco comercial, aplicam leis diferentes de importação em cada país membro.

O Brasil pediu para fazer parte do processo de consultas, em 2004, mas a solicitação foi rejeitada pela UE. O Itamaraty ainda não decidiu se fará parte da queixa, mas admite que os exportadores nacionais sofrem com a falta de uniformidade entre os países da UE.