Título: 52% dos médicos prescrevem tratamentos alternativos
Autor: Adriana Dias Lopes
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/01/2005, Vida &, p. A8

Aquela clássica imagem de que os médicos são céticos e só reconhecem terapias com evidências científicas pode estar ultrapassada. Ao menos foi o que provou o cirurgião Kazusei Akiuama em sua tese de doutorado defendida na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP). De acordo com o trabalho, 52% dos médicos endossam ou prescrevem algum tipo de medicina complementar e alternativa. Entre as mais citadas na pesquisa estão acupuntura, homeopatia, terapias de grupo, dietas (da Lua e de Atkins, por exemplo), massagens alternativas (tailandesa, shiatsu), florais de Bach e hipnose. Os resultados mais impactantes, porém, são os seguintes: 81,3% dos médicos disseram que essas terapias são úteis para o tratamento do paciente e 91% concordam que é importante o médico ter conhecimento delas. Em relação à familiaridade com esse tipo de prática, 62,4% já tiveram contato pessoalmente e 52,2%, profissionalmente.

Para chegar aos resultados, Akiuama entrevistou de outubro de 2002 a fevereiro de 2003, um grupo de 537 médicos de 80 especialidades e subespecialidades, todos selecionados aleatoriamente e residentes em São Paulo. "O que mais me impressionou foi o fato de que eles gostariam de ter mais conhecimento sobre as terapias alternativas, mesmo sendo impossível praticar a maioria delas, ao menos legalmente", diz Akiuama.

Em setembro de 1998, o Conselho Federal de Medicina (CFM), assim como os Conselhos Regionais de Medicina (CRMs), proibiram a classe médica de fazer uso de práticas terapêuticas não reconhecidas pela comunidade científica. As únicas que até agora mereceram o aval dos conselhos foram a homeopatia (aprovada 1980) e a acupuntura (aprovada em 1995). O médico que praticar qualquer técnica além dessas duas pode ser processado por infração ética e até ter o diploma cassado.

"Os conselhos não são fechados. É possível sempre rever posições", explica Isac Jorge Filho, presidente do Cremesp. "Mas, para isso, deve ser comprovado cientificamente se a terapia traz ou não benefícios ao paciente. O paciente não é cobaia."

INDICATIVO

Akiuama garante que sua tese de doutorado não tem a pretensão de recomendar ou defender modalidades alternativas. "Mas acredito que os resultados sejam sinais de que os médicos estão mudando de opinião", diz ele. "De alguma forma, estão se aproximando das técnicas complementares."

O clínico Arnaldo Lichtenstein, do Hospital das Clínicas, em São Paulo, é um deles. "Não pratico a acupuntura e a homeopatia por falta de conhecimento técnico, mas indico as duas terapias aos meus pacientes como complemento da alopatia", diz ele. "A acupuntura, ao contrário do que muitos colegas pensam, é uma ótima opção para quem tem dores crônicas e não pode tomar antiinflamatórios. A homeopatia funciona muito bem com alergias."

Os motivos de os médicos estarem menos céticos não foram estudados no doutorado. Mas, por coincidência, tanto Lichtenstein quanto Akiuama têm a mesma teoria a respeito: o paciente se interessou antes pelas terapias e acabou levando essa nova realidade ao consultório médico.

"Muitas vezes o paciente prefere o tratamento alternativo nem tanto pela eficácia, mas pelo tempo que o profissional gasta com ele no consultório. A duração da consulta de uma terapia alternativa é sempre maior em relação às consultas tradicionais", conta Lichtenstein. "Isso acontece tanto por conta das técnicas elaboradas de aplicação das terapias alternativas, como também pela própria postura do profissional, que se interessa pelo doente e não só pela doença. Talvez se a maioria dos médicos resgatasse a forma humanizada de atender o paciente, muitas terapias alternativas não tivessem conquistado tanto espaço."