Título: Kirchner pede cautela na negociação
Autor: Ariel Palacios
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/01/2005, Economia, p. B3

Otimismo, mas sem alarde. Essa é a ordem do presidente argentino, Néstor Kirchner, a seus subordinados. A idéia é manter um clima de sóbrio entusiasmo pelo aparente bom resultado obtido no início do processo de reestruturação da dívida pública com credores privados. A troca de títulos começou na sexta-feira e, no primeiro dia, obbteve adesão de 25% dos credores, majoritariamente fundos de pensão, companhias de seguros, bancos locais e parte dos pequenos investidores argentinos. Esta reação já era esperada. Por isso, o secretário de Finanças, Guillermo Nielsen, declarou em Roma que o governo está "muito otimista", mas ainda "não vai cantar vitória". Citando o bordão do ministro da Economia, Roberto Lavagna, Nielsen disse que agora "é hora dos mercados falarem". O secretário - que está na Itália para um road show, no qual tentará seduzir credores reticentes - disse que a proposta argentina é definitiva.

Nielsen rebateu as críticas de grupos de credores, de que a Argentina poderia pagar mais, pois cresceu mais de 8% em 2003 e 2004: "Não podemos nos basear em apenas dois anos para extrapolar o que teremos que pagar nos próximos 40. Isso poderia provocar um novo default em três anos."

Credores da Argentina e também da Alemanha, Itália, EUA e Japão reclamam do drástico corte no valor da dívida, em média de 65%. Em casos de calotes anteriores, como da Rússia e Equador, a redução foi, em média, de 35%.

Segundo Nielsen, braço-direito de Lavagna, "os credores precisam entender que crises tão profundas não se resolvem sem compartilhar perdas".

BÔNUS

O governo Kirchner oferece três novos bônus - o par, semi-par e o discount - em substituição aos 152 títulos em estado de calote. Os prazos para pagamento oscilam entre 30 e 42 anos.

O governo conta com a adesão de argentinos que compraram títulos no exterior, basicamente na Suíça e nos Estados Unidos. A maioria, calcula-se, não declarou a compra à Receita. Portanto, seus donos não poderiam recorrer à Justiça para reaver a totalidade do dinheiro e seriam obrigados a aderir. Esses credores somariam outros 15% de potenciais participantes da troca de dívida.

Neste fim de semana, os fundos de investimentos do Banco Francés, do Banco Río e do BankBoston informaram a seus clientes que também aderirão à troca. O Citicorp aderiu na sexta-feira. Analistas acreditam, no entanto, que as semanas decisivas serão as últimas.

Analistas em Buenos Aires acreditam que a sobriedade demonstrada pelo governo Kirchner na questão da dívida é uma estratégia nova em relação ao comportamento agressivo que teve ao longo do último ano e meio. Segundo eles, esta é uma forma de não irritar os mercados durante o período de troca da dívida.

Enquanto Nielsen e outros integrantes da equipe econômica viajam pelos principais centros financeiros, o governo Kirchner tenta manter um clima de tranqüilidade política no cenário interno, para evitar turbulências que possam prejudicar a troca de títulos velhos pelos novos.