Título: Reforma não fere autonomia, diz Tarso
Autor: Gabriel Manzano Filho
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/01/2005, Nacional, p. A7

O ministro da Educação, Tarso Genro, considera "elogiável o interesse pelo debate", manifestado ontem pelos dirigentes de universidades particulares que criticaram o anteprojeto de reforma universitária. "É isso que queremos", garantiu o ministro, que fez também uma promessa: o MEC retirará do texto qualquer item que fira a autonomia universitária - uma das queixas centrais daqueles dirigentes. "Se ficar claro que temos posições, no anteprojeto, que ferem a autonomia universitária, quero declarar desde já que retiraremos esses trechos. Não temos intenção de levar adiante nenhum projeto que fira essa autonomia", adiantou. A promessa do ministro é uma reação aos temores manifestados ontem, ao Estado, por lideranças do ensino superior particular que consideram o texto do MEC "claramente preconceituoso contra a iniciativa privada". Organizadas em um Fórum Nacional da Livre Iniciativa na Educação, essas lideranças estão convocando universidades, centros universitários e fundações privadas para articular uma contraproposta ao documento do governo.

Mas Tarso Genro advertiu que, embora novas idéias sejam bem recebidas, "para qualquer alteração devemos agir dentro dos marcos da Constituição". Entre esses marcos ele aponta os compromissos com a gestão democrática e com a redução das desigualdades sociais, presentes em diferentes artigos constitucionais.

Tarso nega que os dispositivos anunciados no texto da reforma sejam contra a iniciativa privada. "São, isto sim, contra a transformação da educação em mercadoria desqualificada", sustentou. "Por outro lado, também não ignoramos os objetivos essenciais da educação superior, entre eles a afirmação de valores políticos e sociais."

O ministro rebate algumas das críticas feitas pelas universidades particulares - entre elas a de que o anteprojeto tem um viés ideológico. "Não vemos como estranhar a proposta, incluída no art. 4.º do anteprojeto, de adotar "critérios universais de renda ou específicos de etnia", exemplificou. A base para esses critérios (que introduzem as cotas na seleção de alunos) são os arts. 3.º e 4.º da Constituição Federal, nos quais são é mencionado como dever das instituições republicanas combater as desigualdades sociais. (No seu item III, o art. 3.º da Constituição inclui entre objetivos fundamentais da República "erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais". No inciso VIII do art. 4.º consta "o repúdio ao terrorismo e ao racismo".)

"A intenção", acrescenta Tarso Genro, "é estabelecer um marco regulatório" para a educação superior. Ou seja, criar uma estrutura legal, em termos nacionais, que padronize posturas e objetivos dessa atividade. Ele volta ao exemplo das cotas: "Nós já temos políticas de cotas em universidades no Rio de Janeiro, em Brasília e na Bahia. Se o MEC não organizar isso de forma adequada, em termos nacionais, estaremos aceitando uma desigualdade. Portanto, ao introduzir esse item estamos cumprindo um dispositivo constitucional."

Da mesma forma, a preocupação com desigualdades sociais e regionais. A muitos dirigentes. diz ele, isso pode parecer uma preocupação estranha às questões universitárias. Tarso discorda. O princípio da gestão democrática, argumenta, está nos arts. 205 e 206 da Constituição. O primeiro define a educação como "direito de todos e dever do Estado" e o segundo elege entre seus princípios, no inciso VI, a "gestão democrática do ensino público, na forma da lei". "De novo, estamos pondo em prática normas recomendadas pela Constituição. Se não o fizéssemos, estaríamos sendo omissos."