Título: Tribunais ignoram reforma e dão férias
Autor: Laura Diniz
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/01/2005, Nacional, p. A10

Pelo menos 19 dos 27 Tribunais de Justiça estaduais e 3 dos 5 Tribunais Regionais Federais do País estão agindo em desacordo com a Constituição. A reforma do Judiciário, publicada no dia 30 de dezembro, determinou o fim das férias coletivas de desembargadores em tribunais de segunda instância, mas a grande maioria das Cortes não respeitou a regra. Os presidentes dos tribunais levantam dois argumentos para justificar o trabalho apenas em regime de plantão e a manutenção da folga dos colegas. Um é que não deu tempo de organizar a pauta de julgamento em poucos dias, após a publicação da lei. Outro é que a regra ainda precisa ser regulamentada por uma lei complementar.

"A situação atual é típica de uma mudança recente, que, a rigor, ninguém tinha certeza quando iria acontecer. A reforma tramitava há 13 anos e havia chances de ser votada em segundo turno no Senado apenas em fevereiro", disse o coordenador do Gabinete de Assuntos Institucionais da Presidência do Supremo Tribunal Federal (STF), juiz Flávio Dino. "Mas é fato que os tribunais não se prepararam", admitiu.

AUTO-APLICÁVEL

A falta de tempo é evocada pelo presidente do TRF da 4.ª Região (Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná), desembargador Vladimir Passos de Freitas, para justificar a volta plena aos trabalhos só em 1.º de fevereiro. "O juiz de segundo grau tem de colocar processo em pauta hoje para julgar três semanas depois. Ninguém colocou nada porque não sabíamos quando a reforma seria publicada", justificou.

Na 3.ª Região (São Paulo e Mato Grosso do Sul) houve mais planejamento e o tribunal funciona a todo vapor. "Não sabíamos se a reforma seria publicada antes de 2 de janeiro, mas reunimos o Conselho do Tribunal no dia 19 de dezembro e nos programamos para o caso de ela sair", explicou a presidente da Corte, desembargadora Anna Maria Pimentel.

Compreensivo com a questão do tempo, Dino rejeita o segundo argumento, de que é preciso mudar a Lei Orgânica da Magistratura para regulamentar a regra. "O comando é claro, auto-aplicável. Só há necessidade de regulamentação por outra lei quando o texto é vago e pode haver várias interpretações. Nesse caso, a decisão depende apenas de uma mudança no regimento interno dos tribunais", esclareceu.

Com a instalação do Conselho Nacional da Justiça, prevista para abril ou maio, esse tipo de problema deve acabar. Em julho não haverá desculpas para a manutenção das férias coletivas. Antes da reforma, os tribunais eram autônomos, mas agora as decisões administrativas serão uniformizadas. "O conselho vai catalisar essas preocupações e auxiliar na ordenação", explicou Anna Maria. "Seu papel principal, em resumo, é fazer com que as coisas funcionem."