Título: Documento tenta agradar a quem faz maior pressão
Autor: Gabriel Manzano Filho
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/01/2005, Nacional, p. A10

Num país onde um aluno universitário custa dez vezes mais que o do ensino básico (a média no exterior é três vezes mais) a apresentação de um documento que ignora a importância de uma boa gestão denuncia, na verdade, uma estratégia política. "O governo, no Brasil, abandona o ensino fundamental para investir no ensino superior. É como começar a casa pelo telhado. E por quê? Porque é no ensino superior que está a pressão política organizada - o ensino médio não existe políticamente. A universidade é o segmento mais loquaz, mais visível. Essa atitude de ceder ao político e adiar o estratégico gera tais deformações", constata o consultor Leal Lobo. Por outro lado, a preocupação com inclusão social é justa - não há quem discorde - mas reservar 50% das vagas nas universidades federais para egressos de escolas públicas "é um pouco demais", diz ele. Foi a preocupação com inclusão que levou à decisão de introduzir as cotas - mas como o próprio ministro Tarso Genro afirmou, ao assumir o ministério, o problema no País não é de cor, é de pobreza. E é bom lembrar que a cada ano 1,8 milhão de alunos terminam o ensino médio e o conjunto do sistema lhes oferece no total 1,1 milhão de vagas - uma proporção bem razoável.

A insistência na eleição direta do reitor, outra das inovações trazidas no anteprojeto, é puramente ideológica, diz Lobo. "Em Cuba, quem escolhe o reitor da Universidade de Havana é o comandante Fidel, como me contou um ex-reitor", lembra o consultor. Lá, alunos não votam para reitor. "E sabe por quê? Porque para eles universidade é coisa séria, é parte do planejamento estratégico."