Título: Davos reúne líderes para ditar a agenda internacional
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/01/2005, Economia, p. B5

Consciente de que a estabilidade econômica internacional ainda está ameaçada, o Fórum Econômico Mundial realiza seu evento anual a partir de quarta-feira, em Davos. A reunião servirá antes de tudo para convocar os líderes a tomarem para si a responsabilidade de realizar ações concretas para resolver questões difíceis, como estabilidade financeira, proteção ao meio ambiente, redução da pobreza, reforma da previdência nos países ricos ou a paz no Oriente Médio. Os diretores de Davos não escondem: não querem só debater a situação mundial. Querem ditar a agenda internacional. O evento de cinco dias terá como ponto principal a responsabilidade de líderes por tomar decisões difíceis. No total, 2,2 mil participantes estarão na Suíça, entre eles, políticos, empresários, religiosos, sindicalistas, escritores e astros internacionais como Paulo Coelho e Sharon Stone.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que estará em Davos pela segunda vez, será o único chefe de Estado da América Latina. Davos conta com Lula para trazer uma mensagem dos países emergentes, especialmente na questão do combate à fome. Lula, que também estará no Fórum Social de Porto Alegre, participa de uma sessão em Davos sexta-feira. No dia seguinte, recebe empresários para debater projetos de investimentos com as Parcerias Público-Privadas.

Uma mesa-redonda está programada para debater a situação do Brasil. Enquanto isso, o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, participa ao lado de Anne Krueger, número 2 do Fundo Monetário Internacional, de um debate sobre o endividamento de países emergentes. Luiz Fernando Furlan, ministro do Desenvolvimento, vai falar sobre o futuro da América Latina.

Outra reunião que contará com a participação do Brasil será o encontro entre 25 ministros para debater as negociações da Organização Mundial do Comércio (OMC) em seu momento crítico. A presença de Robert Zoellick, representante comercial dos Estados Unidos, também dará a possibilidade para que o chanceler Celso Amorim trate da Área de Livre Comércio das Américas (Alca). Zoellick será o único representante do alto escalão do governo Bush em Davos. O ex-presidente Bill Clinton e o senador John Kerry, derrotado por Bush, vão. No total, 26 presidentes e primeiros-ministros estarão em Davos.

Ao contrário dos anos anteriores, em 2005 os debates não serão marcados por um só tema. Em 2003 e 2004, a guerra no Iraque permeou a maioria das discussões. Já em 2002 o terrorismo era o grande assunto. O Fórum Econômico de 2001 ainda foi marcado pelo estouro da bolha da internet.

Davos quer aproveitar para dar novo impulso a negociações em impasse. "Estamos em um momento crítico para o mundo e seus líderes. Há vários atores novos, do presidente da Comissão Européia, José Manuel Barroso, ao novo presidente palestino, Mahmoud Abbas. Eles vão a Davos para avaliar caminhos para construir uma nova situação para o mundo. O que precisamos é de um otimismo pragmático", afirmou Klaus Schwab, diretor de Davos. Para ele, o mundo deve aproveitar o "espírito de esperança e solidariedade" surgido depois dos tsunamis para fazer com que a agenda internacional avance.

O setor privado, com cerca de 1 mil executivos, também será convocado. Bill Gates, da Microsoft, Charles Prince, do Citigroup, e Daniel Vasella, da Novartis, vão liderar os debates. "Com a participação das maiores empresas do mundo, o encontro permitirá que o setor privado ajude a moldar a agenda global", diz Peter Torreele, diretor de Marketing do evento.

Perguntado sobre quem teria dado o mandato à Davos para moldar a agenda internacional, o chefe da Assessoria de Imprensa da entidade, Mark Adams, respondeu: "E quem deu um mandato para a organização Médicos Sem Fronteira realizar seu trabalho, quem deu o mandato à Igreja?"

Para tentar dar uma sensação de democracia, o fórum inovou e realizará sua primeira reunião na prefeitura do vilarejo. Lá, os participantes poderão definir quais os debates que serão priorizados no encontro. Para ser participante, porém, o Fórum cobra uma inscrição de US$ 12 mil por empresa, além de uma taxa anual de cerca de US$ 25 mil. "Não somos uma organização com fins lucrativos. Somos uma organização não-governamental", disse Torreele.

Quanto à possibilidade de um diálogo com o Fórum Social de Porto Alegre, Schwab desconversa: "Temos uma voz forte do mundo em desenvolvimento em Davos e de países que são afetados pela pobreza. Estamos felizes com a participação de Lula e de autoridades africanas."

Ele alega que o evento no Brasil é baseado em ideologia, enquanto a reunião na Europa está aberta a todas as opiniões. Ele não disse qual seria a ideologia de Porto Alegre. "Diríamos que é uma ideologia esquerdista, mas não quero usar essa linguagem, pois é um termo velho, inadequado ao mundo atual."