Título: Pesca e comércio põe em risco os cavalos-marinhos
Autor: Evanildo da Silveira
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/01/2005, Vida &, p. A14

A pesca predatória e a destruição de hábitats importantes para seu ciclo de vida, como mangues e recifes de corais, está colocando em risco as duas espécies conhecidas de cavalos-marinhos do Brasil. No ano passado, ela entraram para a lista de animais superexplorados para fins comerciais do Ministério do Meio Ambiente (MMA). Para tentar reverter a situação, várias universidades e o MMA se uniram num projeto de pesquisa, que está fazendo um levantamento da população desses peixes no litoral do País e um plano de manejo. Na verdade, o trabalho vem sendo feito desde 2000, quando a pesquisadora Ierecê Lucena Rosa, da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) criou o primeiro projeto de estudo e conservação dos cavalos-marinhos do Brasil.

Em 2002, as pesquisas passaram a ser feitas em conjunto com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e com as universidades Federais do Ceará (UFC), Pernambuco (UFPE), São Carlos (UFSCar), Fluminense (UFF) e Estadual da Paraíba.

Entre as principais descobertas do trabalho está o grande comércio desses peixes. "Os cavalos-marinhos são comercializados vivos ou secos em praticamente toda a costa brasileira", diz Ierecê. "Uma das principais fontes para esse comércio é a pesca industrial do camarão, pois os cavalos-marinhos, assim como outros animais, são arrastados juntos nas redes que pegam os crustáceos."

É o que se chama de descarte da pesca. No caso dos cavalos-marinhos, no entanto, muitos pescadores secam esses animais nos seus barcos e os vendem para comerciantes de remédios caseiros, para lojas de umbanda (onde são vendidos como amuletos) e como souvenir ou artesanato. Além dessa forma de comércio, os peixes também são vendidos como animais ornamentais para aquários.

Segundo Ierecê, pelo menos 77 países comercializam os cavalos-marinhos, entre eles o Brasil. "O papel do nosso País nesse setor vem crescendo nos últimos anos e hoje se estima que seja um dos cinco maiores exportadores desses peixes vivos", explica. "Em 2000, o Brasil vendeu cavalos-marinhos para 19 países."

Diante desse quadro e dos primeiros resultados das pesquisas, o MMA, por meio do Ibama, resolveu reduzir o comércio de cavalos-marinhos. "Em maio do ano passado, baixamos a Instrução Normativa n.º 5, que reduz as cotas de exportação", diz Rômulo Mello, diretor de Fauna e Recursos Pesqueiros do Ibama. "Em 2001 cada empresa poderia exportar 5 mil espécimes. Em 2002 o número caiu para mil e agora para 250. O número de empresas também diminuiu, de 14 em 2002 para 3 agora."

A importância dos manguezais para os cavalos-marinhos é outra descoberta importante da pesquisa coordenada por Ierecê. "Os mangues não servem apenas como fonte alimento, mas também como local de reprodução e abrigo", explica. "Os cavalos-marinhos utilizam sua cauda preênsil para agarrar raízes de mangue ou organismos que se fixam nelas, para se abrigar dos predadores."

Se é possível controlar o comércio, o mesmo não se consegue com a pesca. A bióloga Ana Maria Torres, do Ibama, em Itajaí, responsável pela pesquisa na costa catarinense, lembra que a pesca de arrasto do camarão, maior responsável pela captura de cavalos-marinhos, é uma atividade legal. "Não há muito a fazer", diz. "A pesca ilegal, por sua vez, é difícil de fiscalizar. Imagina controlar todas as praias do litoral brasileiro?"

Por isso, o Ibama pretende usar os resultados do trabalho dos pesquisadores para estabelecer um planto de gestão ambiental para os cavalos-marinhos. "Além de reduzir as cotas, poderemos adotar outras medidas de proteção e conservação desses peixes", explica Melo. "Se for o caso, podemos até mesmo impor uma moratória na sua pesca."