Título: Saldo externo é o maior da história
Autor: Sheila D'Amorim
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/01/2005, Economia, p. B1

Apesar de o real ter se valorizado em relação ao dólar em 2004, reduzindo o ganho dos exportadores, e de o crescimento da economia ter impulsionado os gastos com importados, ainda assim o Brasil fechou o ano passado com um recorde nas contas externas: superávit de US$ 11,7 bilhões, o maior desde o início da série histórica, em 1947. Isso significa que as despesas com importações, contratação de serviços estrangeiros, pagamento de juros e remessas de lucros ao exterior foram integralmente cobertas por receitas obtidas, sobretudo, com a venda de produtos brasileiros no mercado externo e ainda sobraram recursos para o País. Esse dinheiro extra, por sua vez, compensou o rombo de US$ 7,3 bilhões nas contas de capital e financeira, onde estão as saídas de dólares para quitar empréstimos antigos. O governo federal pagou US$ 4,4 bilhões ao Fundo Monetário Internacional (FMI) por empréstimos tomados até 2003, e muitos empresários se sentiram estimulados para se livrar de passivos vinculados ao câmbio. Em 2004, acredita-se que a produção nacional tenha crescido cerca de 5%, com mais lucro para as empresas. Com mais dinheiro em caixa e o real valorizado, o momento se tornou oportuno para quitar débitos atrelados ao dólar.

Esse movimento teve impacto direto na taxa de rolagem da dívida externa. Em média, apenas 65% dos empréstimos bancários e pelo lançamento de títulos foram renovados em 2004. "Essa tendência de liquidar dívidas foi mantida no início deste ano", destacou o chefe-adjunto do Departamento Econômico do Banco Central, Luiz Malan. Nos 20 primeiros dias do ano, esse porcentual foi de apenas 26%.

O bom desempenho do comércio exterior em 2004 foi reforçado pelo resultado de outros itens das contas externas que também aumentaram a entrada de dólares no País. Foi o caso das receitas com turistas, que chegaram a US$ 3,2 bilhões no ano - um recorde, segundo o ministro do Turismo, Walfrido dos Mares Guia. Isso fez com que o saldo das viagens internacionais, já abatidas as despesas de brasileiros no exterior, ficasse em US$ 351 milhões no ano. Em 2005, o ministro acredita que o desempenho será mantido. "Temos a meta de aumentar em 1 milhão o número de turistas em visita ao País este ano", afirmou, ressaltando que, pela primeira vez, os turistas europeus encabeçam a lista dos que mais visitam o País, deixando para trás até mesmo os sul-americanos.

Apesar do reforço do dinheiro dos europeus, o aumento das despesas de brasileiros em viagens internacionais no mês passado derrubou o superávit do turismo para US$ 21 milhões, ante os US$ 72 milhões de dezembro de 2003. E a expectativa do BC, segundo Malan, é que, com a recuperação na renda no País, esses gastos aumentem, o que exigirá mais esforços para elevar também as receitas com turistas estrangeiros.

Mesmo com um superávit menor nas viagens internacionais em dezembro, o Brasil apresentou o melhor resultado nas contas externas para o mês desde a década de 80: superávit de US$ 1,2 bilhão. Isso graças ao desempenho do comércio internacional. Ao longo de 2005, entretanto, esse resultado deverá se reverter e Malan acredita que o saldo do ano ficará próximo de zero.

Além de um menor superávit da balança comercial, que segundo as estimativas do BC cairá dos US$ 33,7 bilhões de 2004 para cerca de US$ 25 bilhões, o déficit na conta de serviços e rendas - onde estão não só o saldo de viagens internacionais, mas também as despesas com fretes, aluguel de equipamentos, remessas de lucros e pagamento de juros - crescerá em US$ 3 bilhões.

MERCADO FINANCEIRO

Apesar da série de aumentos da taxa de juros iniciada em setembro do ano passado, a entrada de recursos externos para aplicação no mercado financeiro foi negativa em 2004. Isso contraria, em parte, as críticas de que o nível atual de juros estaria provocando uma entrada forte de capital internacional, puxando para baixo a taxa de câmbio. Na verdade, os investimentos de estrangeiros em operações com títulos de renda fixa apresentaram, no ano passado, uma saída líquida de US$ 6 bilhões. Somente em dezembro o saldo negativo foi de US$ 553 milhões.