Título: 2.º mandato estabelece a dinastia
Autor: John F. Harris
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/01/2005, Internacional, p. A16

Em meio às celebrações da posse surgiu um momento surpreendentemente íntimo entre pai e filho. Enquanto a parada de John F. Kennedy passava diante do camarote onde Joseph P. Kennedy estava assistindo, o novo presidente olhou e tocou o seu chapéu - um gesto de afeição e gratidão com o patriarca que durante anos sonhou em colocar um filho na Casa Branca. Quarenta e quatro anos mais tarde, enquanto o presidente George W. Bush se prepara para iniciar seu segundo mandato, seu pai é que poderia tocar o chapéu para ele.

Uma das realizações do 43.º presidente ao ser reeleito, segundo historiadores e amigos da família Bush, é aliviar o peso do fracasso do 41.º presidente quando tentou a reeleição. A vitória do Bush filho também estabelece fortemente um fato que antes poderia ser contestado: os Bushes hoje pertencem às grandes linhagens políticas da história dos EUA.

Pode não haver um "estilo Bush" diferenciado que outros políticos tentem imitar, como fizeram com a aparência e o jeito de JFK. A família ainda tem de capturar o romantismo chique dos escritores de ficção e produtores de Hollywood. O atual presidente iniciará um segundo mandato, segundo as pesquisas, com quase tantos americanos insatisfeitos com sua presidência quanto aqueles que estão satisfeitos com ela. Não importa.

Objetivamente, dizem os estudiosos de política, Bush é um nome que hoje está próximo de Adams, Kennedy e Roosevelt como uma força cuja influência dura décadas.

Robert Dallek, autor de um livro recente sobre JFK e de outras biografias presidenciais, não é um admirador das políticas de George W. Bush, mas reconheceu que a vitória deste eleva pai e filho a um novo patamar histórico.

Com uma derrota em novembro, o legado da família Bush teria tido uma certa qualidade acidental: um pai que havia chegado ao Salão Oval pela vice-presidência, mas não conseguiu um segundo mandato, e um filho que se tornou presidente apesar de perder na votação popular. Em vez disso, a vitória apertada, mas incontestável, lança nova luz sobre as formidáveis realizações da família.

Ao fim do mandato do 43.º presidente, os Bushes terão ocupado a Casa Branca por 12 dos 20 anos anteriores - "igualando-se a Franklin D. Roosevelt em termos de tempo no gabinete", apontou Dallek. "Isso dá a Bush pai mais espaço na história do que ele poderia ter tido."

A dinastia política Bush tem algumas características diferenciadas. A mais notável é sua trajetória claramente ascendente, cada geração ultrapassando o sucesso político da anterior. Prescott S. Bush, avô do 43.º, foi eleito para o Senado dos EUA com 57 anos em 1952, servindo dois mandatos antes de se aposentar. George Herbert Walker Bush saiu de dois mandatos na Câmara americana e passou por uma série de nomeações presidenciais antes de seu único mandato como presidente - perdendo para o democrata Bill Clinton.

A maios parte das dinastias políticas, pelo menos no século passado, teve um momento de queda. Alguns dos quatro filhos de Franklin D. Roosevelt que sobreviveram à vida adulta eram ambiciosos politicamente, mas nenhum teve uma carreira historicamente conseqüente. Franklin D. Roosevelt Jr. chegou perto, tornando-se congressista por Nova York, mas perdeu a corrida para governador. E, apesar de a família Kennedy ter sido durante anos sinônimo de carisma e ambição política, nenhum integrante da família depois de JFK alcançou a presidência, e ninguém nas gerações que sucederam a ele e a seus dois famosos irmãos, Robert e Edward, ambos senadores, se aproximou de suas realizações políticas.

O sucesso da família Bush é ainda mais impressionante por outra razão: muitos admiradores encaram os Bushes como personagens comuns e ficaram surpresos em testemunhar como as atuais políticas presidenciais remodelaram a política americana e o mundo em geral.

"Os Bushes não são uma família muito carismática", disse Victor Gold, um veterano assessor político que tem amizade com a família há três décadas. "Quando se está com eles, não se tem o sentimento de uma família política do modo como era com os Kennedys. Não há glamour e eles não vendem a si mesmos dessa maneira." O resultado é que este presidente, apesar de inspirar muita devoção entre seus defensores, não transcendeu a política e não infundiu sua imagem e estilo na cultura, como John F. Kennedy e Ronald Reagan conseguiram.