Título: Novos prefeitos encontram municípios quebrados e fora da lei
Autor: Carlos Marchi
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/01/2005, Nacional, p. A4

Ganhar a eleição foi uma festa para cada um dos 5.562 prefeitos eleitos em 2004, mas para muitos a posse só trouxe problemas. Em Fortaleza, a prefeita Luizianne Lins (PT) não tem funcionários para as áreas da educação, saúde e assistência social; em Itu (SP), Herculano Júnior (PV) topou com salários atrasados, a cidade abandonada e dívidas de R$ 140 milhões; em Camaragibe (PE), João Lemos (PC do B) teve de levar material de limpeza de casa para limpar o gabinete. Em Belém, Duciomar Costa (PTB) denunciou à polícia o desaparecimento de discos rígidos de computadores da prefeitura. Ontem a Confederação Nacional dos Municípios (CNM) confirmou que metade das cidades (50,21%) tinha, no fim de 2004, restos a pagar superiores aos ativos financeiros de que dispunham. A informação consta de estudo da CNM divulgado no dia 19 de dezembro pelo Estado. "Esses resultados só aparecerão em maio, quando os prefeitos fizerem sua prestação de contas. Mas dados do Tesouro Nacional indicam desde já que metade das prefeituras não conseguirá se adequar à Lei de Responsabilidade Fiscal", diz o presidente da CNM, Paulo Ziulkoski. Ao chegar ontem para o primeiro dia útil à frente da prefeitura de São Gonçalo (RJ), a prefeita Aparecida Panisset (PFL) encontrou um único computador em todo o gabinete - e com defeito. Seu primeiro grande problema é pagar o mês de dezembro dos servidores inativos, conta que o antigo prefeito Henry Charles (PTB) deixou intacta. O primeiro ato do novo prefeito de Manaus, Serafim Correa (PSB), foi dispensar 2,5 mil nomeados pelo antigo prefeito Luiz Alberto Carijó para mais de 50 grupos de trabalho que, diz Serafim, tinham finalidade eleitoreira. Em Porto Alegre, José Fogaça (PPS), que destronou quatro gestões do PT, prevê contenção de gastos nos primeiros meses e criticou a gestão petista, que cobrou adiantado o IPTU de 2005 e ainda pediu R$ 22 milhões emprestados ao Departamento Municipal de Água e Esgotos (DMAE) para pagar parte do funcionalismo. Em Nova Iguaçu (RJ), o estreante Lindberg Farias (PT) começou o dia negociando com os 1.400 funcionários terceirizados do Hospital da Posse - que é federal, mas está sob administração municipal - cujos contratos de trabalho venceram no mês passado. "Se todos fossem embora, o hospital parava", comentou Lindberg, feliz, ao conseguir que os servidores voltassem ao trabalho ante o compromisso de que vão receber seus salários. A dívida da prefeitura é de R$ 330 milhões - pouco mais de 1% da dívida total que o prefeito José Serra vai administrar em São Paulo -, calculou o prefeito, dando razão aos estudos da CNM. O prefeito de Duque de Caxias (RJ), Washington Reis (PMDB), enfrentou no primeiro dia um enorme protesto de servidores municipais que ainda não receberam o salário de dezembro, numa conta que chega aos R$ 20 milhões. Mas não foi a única cobrança. Representantes de empresas fornecedoras foram à prefeitura cobrar R$ 30 milhões de dívidas atrasadas. O novo prefeito de Bauru, Tuga Angerami (PDT), encontrou um cofre vazio e a obrigação inadiável de pagar os salários de dezembro aos 4.800 funcionários ativos e os 1.100 inativos. Ele negociou com o Banco do Brasil um empréstimo para seus funcionários, a juros de 1,81% ao mês. A prefeitura avaliza o empréstimo e pagará ao banco, descontando o valor dos funcionários, que vão ficar com o prejuízo dos juros. Em Capão Bonito (SP), na região de Sorocaba, o prefeito José Carlos Tallarico Júnior (PFL) foi outro que encontrou o gabinete sem os móveis e equipamentos de som e vídeo que estavam lá. "O jogo de sofá, que era novo, foi trocado por outro, um jogo velho", reclamou. Ele vai cobrar as peças sumidas do ex-prefeito Roberto Tamura (PSDB). O prefeito de Itapetininga, Roberto Ramalho (PMDB), lamentava-se ontem que, dos 160 veículos e máquinas da frota municipal, quase um terço está parado por falta de peças, pneus e óleo lubrificante. Ele disse ter encontrado o caixa municipal vazio: o empenho para pagar os salários de dezembro do funcionalismo não foi feito. Pior é a situação do prefeito Hernani Camargo (PHS), de Itaporanga (SP), que assumiu com o funcionalismo em greve e uma vigília de 150 servidores à frente da prefeitura, além de dívidas de R$ 1,1 milhão. Em Camaragibe (PE), João Lemos (PC do B) encontrou o funcionalismo em greve, sem receber salários desde novembro, postos de saúde fechados e lixo pelas ruas. "É melancólico", disse ele, referindo-se às duas gestões de Paulo Santana (PT), seu ex-aliado.