Título: Nome forte garante os negócios
Autor: José Maria Mayrink
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/01/2005, Vida &, p. A10

O Grupo Estado é uma empresa saudável que encerrou 2004 em boas condições financeiras. A informação é do presidente do Conselho de Administração, Francisco Mesquita Neto, que nesta entrevista fala sobre a situação do jornal. Qual é a importância da comemoração de 130 anos de existência para a empresa?

Poucas empresas no mundo têm uma história de 130 anos. Isso mostra que esta empresa tem algumas coisas diferentes de outras. Ela foi fundada por um grupo de liberais e só a partir de um determinado momento (em 1902) meu bisavô, Julio Mesquita, assumiu as ações da empresa. Foi aí que o Estado iniciou o seu processo de empresa familiar. Meu bisavô manteve os objetivos políticos, mas começou a dar um tratamento empresarial ao jornal.

Julio Mesquita cuidava das áreas editorial e administrativa?

Existe um termo em inglês que identifica a função dele, que é publisher, a pessoa responsável pelo conteúdo e pela gestão do negócio. Quando Julio Mesquita morreu, em 1927, houve a primeira sucessão familiar, da primeira para a segunda geração. Ele tinha nove herdeiros. A empresa, que era de um dono, passou a ser de nove donos. Foi assim até 1946, depois da volta do jornal para a família, quando meu tio Julio de Mesquita Filho e meu avô Francisco Mesquita foram comprando as partes dos outros sete. Os dois dividiram as funções, com meu tio Julinho cuidando da área jornalística e meu avô cuidando da área de negócios. Quando os dois morreram no mesmo ano, em 1969, a empresa passou da segunda para a terceira geração, com seis acionistas. Manteve-se a divisão de funções. Meus tios Julio de Mesquita Neto (Estado) e Ruy Mesquita (Jornal da Tarde) cuidavam da parte editorial, enquanto meu pai (José Vieira de Carvalho Mesquita) se encarregava da área financeira e meu tio Zizo (Luiz Vieira de Carvalho Mesquita), da área operacional.

Como é a estrutura atualmente?

Com a morte de meu pai em1988, de tio Julio em 1996 e de tio Zizo em 1997, o processo de sucessão entre uma geração e outra não aconteceu mais ao mesmo tempo, como nas vezes anteriores. Hoje há dois acionistas da terceira geração e 15 acionistas da quarta geração, que é a minha, além de mais de 30 acionistas da quinta geração e 3 futuros acionistas da sexta geração. Com a proliferação de acionistas, o desafio fica cada vez maior. A família não está em nenhum cargo executivo. Nós estamos no Conselho de Administração. Há um comitê subordinado a esse conselho e é através dele que supervisionamos o andamento da empresa. Temos 100% das ações do grupo, mas criamos mecanismos de discussão. Tenta-se buscar, como se diz hoje em administração, o sistema de governança corporativa, de modo que haja uma representação dos acionistas nos fóruns adequados.

Quais foram os períodos mais difíceis para a empresa?

Houve dificuldades desde a fundação. Era uma empresa que tinha de vender assinaturas, de comprar papel, de conseguir publicidade. Tinha de ter uma equação econômica, desde o início. Só que era um jornal contrário à instituição da época, o Império. Na 1.ª Guerra, empresas alemãs, as principais indústrias de São Paulo, cancelaram a publicidade, porque o jornal era contra a Alemanha. Na época de Getúlio Vargas, o problema foi muito sério, o governo pressionando de todas as formas, sempre ameaçando restringir a importação de papel, uma maneira de censurar economicamente. No meu tempo aqui, a primeira crise de que me lembro foi nos anos 70, quando houve um boom na economia e o jornal cresceu muito. As edições de domingo chegaram a ter 320 páginas, sendo mais de 200 páginas de classificados. Com esse crescimento, o jornal tinha de fazer investimento para sair do centro de São Paulo. A logística não permitia mais entrar com caminhões de bobinas e sair com um monte de jornais, todos os dias.

Foi então que se construiu a nova sede, na Marginal do Tietê?

Era uma época favorável para a construção desse prédio. Mas, no final dos anos 70, veio a crise do petróleo, que afetou o País, com desvalorizações cambiais. A empresa enfrentou então, até o início dos anos 80, uma crise financeira difícil. Ficou sem condições de fazer investimentos, teve de reduzir custos e de negociar sua dívida com os bancos. Aí os quatro acionistas que estavam no comando da empresa tomaram uma medida muito inteligente - a criação de um conselho consultivo. Os quatro formavam um conselho de administração e convidaram quatro empresários para ajudá-los a discutir uma solução. Com a ajuda desses empresários - José Mindlin, Antônio Ermírio de Moraes, Roberto Teixeira da Costa e José Carlos Morais de Abreu -, foi feita uma capitalização na OESP Gráfica, empresa ligada à S.A. O Estado de S. Paulo. Com os recursos dessa capitalização deu para pagar o investimento da construção do prédio e da compra de máquinas.

Aí acabou a crise para a empresa?

No final dos anos 80, a empresa conseguiu sair da crise. Mas nos anos 90 começou a famosa moda da convergência. Os entendidos no setor diziam que as empresas de comunicações, as empresas de informática, de tecnologia e as empresas de conteúdo iam se fundir numa única empresa. E que quem não estivesse nessa convergência iria desaparecer. O eixo da convergência era a internet. As empresas de mídia acreditaram nessa tendência e calcularam que o timing ia ser curto. Fizeram investimentos pesados com o dinheiro barato que existia no mercado, para se diversificar. Nós não fomos exceção. Tínhamos um convite para participar de um consórcio que iria concorrer para a telefonia celular em São Paulo. Fizemos um investimento com dinheiro barato, em 1997, quando o câmbio era de 1 para 1. O final dos anos 90 foi muito bom para a empresa. Parecia que o projeto teria bastante resultado, até a hora em que houve a desvalorização cambial no Brasil, em 1999. A crise culminou com o 11 de Setembro. A bolha da internet estourou, desvalorizando os negócios de telecomunicação, o mercado inteiro. O câmbio foi para 3 por 1, quase 4. De 2001 a 2003, nós nos concentramos na busca de uma solução com nossos credores. Pedimos um alongamento de prazo para pagar, jamais nos recusando a pagar.

Qual foi o resultado?

Em 2004 colhemos os frutos. A empresa encerrou o ano com uma geração de caixa estupenda, acima de R$ 125 milhões, com uma margem acima de 20% e com uma dívida renegociada e alongada. A empresa saiu da crise com suas próprias pernas. Conseguiu já em 2004 voltar a fazer investimentos nos seus produtos estratégicos. Temos produtos muito bons, uma marca fortíssima. A marca O Estado de S. Paulo pode ser replicada em outros negócios. Todos os negócios nossos são rentáveis.