Título: O empurrão que vem de cima
Autor: Ana Paula Lacerda
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/01/2005, Economia, p. B16

Investir em micro e pequenos fornecedores se tornou um bom negócio para grandes empresas. O principal motivo é obter fontes alternativas de abastecimento, sem ter de investir na compra de mais terras ou contratação de mais funcionários. E para os produtores, trabalhar com essas empresas é uma garantia de que os produtos serão vendidos. No Rio Grande do Sul, por exemplo, a Aracruz - fabricante de celulose - realiza um projeto chamado Produtor Florestal. Produtores de culturas diversas ou criadores de gado que se interessem pelo plantio de eucaliptos entram em contato com a empresa para transformar áreas ociosas em plantação de florestas. Eles recebem as sementes, adubos, fungicidas e assistência técnica, em troca da madeira produzida. "Existe um vínculo: a produção é vendida para a Aracruz e o pequeno produtor não precisa pagar pelos insumos", explica Sérgio Fávero, coordenador do Fomento Florestal da Aracruz na região.

"Aqui em Guaíba (grande Porto Alegre), há muita gente que trabalha com gado. A floresta se torna uma alternativa a mais de renda para essas pessoas", diz. "E os produtores são novas fontes de madeira para a empresa."

O coordenador calcula que são investidos R$ 800 pela empresa a cada hectare que os micro e pequenos produtores destinam à plantação de eucaliptos. A maioria dos terrenos tem entre 6 e 7 hectares. "Para manter a plantação, o produtor tem de investir mais R$ 1,2 mil por hectare para preparar o solo e cuidar das árvores." Mas o retorno final fica em torno de 25% acima do valor total investido, diz Fávero. "A aceitação do projeto está sendo muito boa. Já temos 11 em andamento e estamos buscando mais interessados."

Para este ano, a empresa pretende criar mais mil hectares em parceria com microprodutores. O programa da Aracruz, criado há 14 anos, atualmente tem 2,6 mil contratos em 120 cidades no Rio Grande do Sul, Espírito Santo, Minas Gerais e Bahia, num total de 58 mil hectares. A área média por contrato é de 22,5 hectares.

Em 2003, a Aracruz investiu R$ 28 milhões na compra de mais de 600 mil metros cúbicos de madeira colhida através do programa, cotado a cerca de R$ 47 o metro cúbico. "Os produtores que cumprem os cronogramas ganham um bônus de R$ 0,70 por metro cúbico em cima deste valor", diz Fávero.

REFRIGERANTE

No outro extremo do País, na região de Maués (AM), a AmBev realiza um programa semelhante com os micro e pequenos produtores de guaraná. A cidade, de 40 mil habitantes, está localizada a 267 km de Manaus e possui pelo menos 3,5 mil produtores. A AmBev, que está na região desde os anos 40, distribui mudas gratuitamente e compra mais de 90% do guaraná produzido. Todos os 800 milhões de litros de Guaraná Antarctica produzidos anualmente são feitos com plantas da região.

Além de fornecer as mudas, a empresa se compromete a comprar o produto a um valor cerca de 40% acima do preço estipulado pela Companhia Nacional de Abastecimento e a apresentar novas técnicas para modernizar o cultivo.

Um acordo entre a AmBev e o Sebrae deve aumentar a produtividade em pelo menos 50% até o fim do ano, segundo a Agência Sebrae. "A empresa se comprometeu a doar entre 40 mil e 50 mil mudas para esses pequenos produtores", informou Wilson Rocha, consultor do Sebrae no Amazonas.

Além disso, ao aderir ao projeto Zona Franca Verde, do Governo do Amazonas, a empresa confirmou um investimento de R$ 61 milhões para desenvolver a região até 2013. Nos últimos dois anos, foram investidos R$ 12 milhões, que possibilitaram, além do aumento na produção de guaraná, a criação de uma microindústria de costura - que gerou 300 empregos - e o início de culturas de cana-de-açúcar e mandioca, novas alternativas de renda.

PETRÓLEO

Além dos microprodutores, os microempresários também se beneficiam das iniciativas das grandes empresas. A Petrobrás vai investir, nos próximos três anos, R$ 6 milhões em micro e pequenas empresas do setor petrolífero. O trabalho, feito em parceria com o Sebrae nacional (que investirá outros R$ 6 milhões), visa capacitar essas empresas para que se tornem fornecedoras de grandes empresas do ramo. Também prevê inseri-las de forma sustentável na cadeia produtiva do petróleo, gás e energia - em especial em territórios onde a Petrobrás atua - e eliminar gargalos.

Nestes temas, cada Estado poderá apresentar projetos e solicitar até R$ 1 milhão ao Sebrae e à Petrobrás. Esse valor deve ser, no máximo, 80% do valor total do projeto. O restante deverá vir das micro e pequenas empresas participantes.