Título: Maior credor argentino recusa acordo
Autor: João Caminoto
Fonte: O Estado de São Paulo, 22/01/2005, Economia, p. B4

O maior credor privado da Argentina não vai aderir à proposta de reestruturação da dívida feita pelo governo do presidente Néstor Kirchner. A informação foi publicada ontem pelo jornal britânico Financial Times. Segundo o diário, a Agência de Reestruturação de Títulos Argentinos (Argentine Bond Restructuring Agency, com a sigla Abra), que representa principalmente investidores de varejo alemães e austríacos com US$ 1,2 bilhão dos bônus em default, disse que tinha "várias reservas relacionadas com a oferta de troca". Em particular, a Abra manifestou "grande preocupação" com a falta de garantias previstas pela cláusula do "credor mais favorecido". Essa cláusula foi feita para dar garantias aos credores de que, após a aceitação da oferta de troca, poderão se beneficiar de qualquer proposta melhor que venha a ser apresentada posteriormente pelo governo argentino aos demais credores.

A cláusula, no entanto, segundo alguns analistas, abre a possibilidade de o governo argentino fechar acordos com credores que não se tornarão universais. Segundo o FT, a posição da Abra é um golpe" para o governo argentino, que está promovendo uma "turnê" internacional para tentar convencer os investidores a participarem da transação.

Comandado pelo economista americano Adam Lerrick e pelo ex-ministro de Finanças do México, Angel Gurría, a Abra integra o Comitê Global de Credores Argentinos (GCAB, na sigla em inglês), presidido pelo italiano Nicola Stock e pelo alemão Hans Humes. Os representantes do GCAB iniciaram ontem uma turnê contra a troca da dívida, paralelamente à turnê que a equipe econômica do ministro da Economia Roberto Lavagna realiza na Europa e nos Estados Unidos. Porém o GCAB não possui mandato de negociação de seus filiados, motivo pelo qual sua representatividade é questionada pelo governo. Já a Abra tem poder de voto dos detentores de bônus aos quais representa. Por isso, sua decisão contrária à oferta argentina é um duro golpe para o governo.

EM CASA

Enquanto o governo argentino enfrenta a rejeição de credores internacionais, no mercado doméstico as estimativas dos analistas sobre o nível de aceitação da proposta de troca dos títulos da dívida continua dentro do esperado por Néstor Kirchner e Roberto Lavagna.

"Hoje poderia garantir que os pedidos de troca (dos títulos em default) já estão em 62% de tudo o que se pode trocar no mercado local", sobre um total de US$ 27 bilhões entre credores de varejo e institucionais, afirmou ontem o presidente da Caixa de Valores da Argentina, Luis Corsiglia.

Ele comentou que, "como detalhe insólito, até o terceiro dia estiveram entrando pedidos pelo bônus Quase Par, coisa que não tem sentido porque os pedidos por esse título se esgotaram no primeiro dia". Em sua avaliação, esse dado é "um ponto positivo para a troca da dívida", assim como a apresentação de credores varejistas que continuam surgindo.