Título: Lula ameaça abrir importações
Autor: Christiane Samarco
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/01/2005, Economia, p. B1

O governo está decidido a pressionar os empresários contra o aumento de preços. Preocupado com a alta da inflação, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva chamou o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), deputado Armando Monteiro (PTB-PE), ao Palácio do Planalto, na última quinta-feira, um dia após o Comitê de Política Monetária (Copom) elevar a taxa básica de juros, a Selic, de 17,75% para 18,25%. Pediu-lhe que levasse ao empresariado o seguinte recado: ou param com a remarcação, que provoca a alta da inflação e força o Banco Central (BC) a aumentar os juros, ou o governo vai abrir as importações. O teor dessa conversa foi relatado pelo próprio Lula à cúpula do PMDB, com quem esteve reunido na mesma quinta-feira. Segundo um dos participantes, o presidente teria dito que pediu a Monteiro para dar um "puxão de orelhas" nos empresários. "Quem está faltando com patriotismo neste momento é o empresariado, ao abusar do aumento nos preços", teria dito o presidente, acrescentando que isso estaria pesando sobre as decisões do Copom.

Um dos ministros palacianos que acompanha de perto este debate conta que a aposta do governo é construir uma parceria com o setor produtivo. O presidente não está propondo pacto algum, e muito menos cogita apelar para o congelamento de preços. Apenas quer chamar todos os atores do processo à razão. No caso do empresariado, a palavra de ordem no Planalto não é acordo nem pacto, é responsabilidade social. E o governo entende que responsabilidade social é não abusar da remarcação de preços.

Mas Lula deixou claro, de antemão, que, fora do cenário da colaboração, o governo tem a alternativa de abrir a importação. Em resumo, diz o ministro, ou os empresários seguram um pouco a larga margem de lucro observada em alguns setores e deixam para cobrar esta fatura no médio ou longo prazo, que é o ritmo necessário para se chegar ao crescimento sustentado do País, ou ficaremos nesta "lengalenga": a cada ameaça de inflação, o BC vai aumentar os juros.

A decisão de pressionar os empresários para forçar a queda de preços no mercado interno tem o apoio das duas principais correntes do governo. Tanto a chamada ala paloccista, defensora do rigor fiscal e monetário adotado pelo ministro Antonio Palocci, quanto os mais críticos da política econômica concordam com a cobrança ao empresariado.

Isso não quer dizer, porém, que a velha briga interna no governo tenha acabado. Os dois grupos continuam se digladiando, como reconheceu um integrante da ala desenvolvimentista em conversa com o Estado. No entanto, hoje todos sabem que, ao menos por ora, Lula não mudará a política econômica.