Título: Brasil tenta adiar acordo antifumo
Autor: Lígia Formenti
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/01/2005, Vida &, p. A9

O governo brasileiro vai tentar retardar a primeira reunião de implementação da Convenção Quadro para Eliminação do Tabaco, promovida pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A idéia é ganhar tempo para que o Senado ratifique a convenção e, com isso, o Brasil tenha também direito a participar do encontro, inicialmente previsto para abril. O diretor-geral do Instituto Nacional do Câncer (Inca), José Gomes Temporão, ficou encarregado de fazer o pedido, numa reunião da OMS com início na segunda-feira, em Genebra, justamente para preparar a 1.ª Conferência das Partes, que pode ser integrada apenas por países que ratificaram o acordo.

A Convenção Quadro determina a adoção de várias medidas para reduzir o número mundial de fumantes, que devem ser executadas por países que a ratificam. Embora tenha exercido um papel fundamental nas negociações do tratado e tenha sido o segundo a assiná-lo, o Brasil ainda não faz parte desse grupo.

A ratificação do acordo está emperrada no Senado, por pressão principalmente da indústria do cigarro e de fumicultores, que temem ficar sem atividade.

O adiamento da reunião daria uma folga maior para convencer os senadores a ratificar o acordo. Segundo Temporão, o ministro da Saúde, Humberto Costa, vai ampliar seu esforço para que o assunto seja retomado tão logo o Senado volte do recesso. "Para o País, é fundamental a participação já nas primeiras reuniões na OMS", afirma o diretor.

ALTERNATIVAS

Temporão observa que, além de estabelecer metas, nos encontros para implantação da Convenção Quadro serão discutidas linhas de financiamento para políticas antitabagistas - algo que o Brasil não quer perder. "Nestes encontros, provavelmente serão debatidas justamente alternativas para substituição de lavouras, incentivos para que fumicultores mudem de atividade, sem serem prejudicados economicamente. E é isso que eles se recusam a entender", completa.

Os fumicultores temem que a implementação do acordo ponha em risco a sobrevivência dos produtores de fumo no Brasil. Argumento sempre desmentido pela diretora do programa para a redução do tabagismo da OMS, Vera Luiza da Costa e Silva.

Vera, que é brasileira, ao longo dos últimos meses fez duras críticas à atuação lenta do Senado nesse assunto. A diretora argumenta que as medidas para redução do consumo de cigarro só vão gerar impacto na produção dentro de 50 anos.

QUEDA NO CONSUMO

Temporão lembra, ainda, que cedo ou tarde alternativas para a substituição do plantio do fumo terão de ser discutidas. "Mesmo se o Brasil não assinar a convenção, outros países vão fazê-lo. E, claro, o consumo mundial de tabaco deverá ao longo dos próximos anos sofrer uma drástica redução."

O diretor do Inca afirma que hoje 90% da produção de fumo no Brasil vai para a exportação. "Não haverá mais mercado para escoamento desta produção. Quanto mais cedo encontrarmos soluções, melhor."