Título: Febem afasta 21 funcionários
Autor: Bárbara Souza
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/01/2005, Metropole, p. C8

Se fugiram pela porta da frente, os 202 internos da Febem que escaparam na quarta-feira à noite das Unidades 3 e 41 do Complexo da Vila Maria, zona norte, tiveram de ultrapassar seis portões para chegar à rua, dois com sistema de comporta (portões duplos). Se escaparam pelos fundos, como afirmaram funcionários, precisaram pular um alambrado de 5 metros, mais um muro de 6 - onde não havia marcas de pés. Tanto mistério na megafuga levou a Febem a afastar 21 funcionários e requisitar abertura de inquérito policial por prevaricação e fraude processual. Investigam o caso a Polícia Civil, o Ministério Público Estadual (MPE) e a Corregedoria da Febem. Entre os fugitivos, estavam 66 das 79 vítimas da sessão de tortura que levou à prisão de 16 funcionários da Unidade 41, no dia 11. Mais 11 servidores estão com a prisão preventiva decretada, mas continuam foragidos. "É muito estranho que a fuga ocorra exatamente na unidade onde houve a tortura e grande parte dos fugitivos sejam esses que foram torturados. Eles são vítimas e testemunhas", disse o presidente da Febem, Alexandre de Moraes, que é também secretário da Justiça e Cidadania. Para Moraes, há indicativos de facilitação de fuga, no que pode ter sido mais um round na briga entre o secretário e funcionários descontentes com as recentes mudanças na entidade. "O histórico, o fato de só haver duas teresas (cordas feitas de lençol), não haver arrombamento, são indícios de facilitação de fuga, de auxílio ou, no mínimo, negligência", afirmou. Ele anunciou ontem o afastamento dos 21 funcionários que trabalhavam na hora da fuga - nenhum deles está entre os que trabalharam na noite da suposta tortura acusados. A decisão foi tomada após reunião com a cúpula da entidade. Segundo Moraes, nos muros, localizados nos fundos das duas unidades, foram encontradas duas cordas que teriam sido usadas para escapar. A parede, pintada de branco, não apresentava marcas de pés. "Logicamente, 202 adolescentes subindo nessas teresas levam um tempo grande, daria tempo de alguém perceber", disse. SUBSTITUIÇÃO Nenhum dos afastados responde a sindicâncias anteriores por irregularidades nem trabalhou na noite da suposta tortura. Amanhã, outros servidores assumirão as unidades da Vila Maria, onde estão internados jovens acusados de delitos graves. Serão 20 agentes educacionais e 10 agentes de segurança, que não terão contato com os internos, ao contrário do que ocorre hoje com os agentes de pátio. Desde ontem, o complexo está sendo monitorado pelo grupo de apoio, conhecido como choquinho. O sindicato da categoria afirmou que os novos servidores contratados em caráter de emergência pela Febem estariam no posto nesse horário. O secretário negou e disse que os funcionários que trabalhavam nas unidades no momento da fuga são antigos. "Basta olhar no livro de ponto." Além de tentar acabar com as provas da tortura com a fuga dos internos que são testemunhas, parte dos funcionários também estaria descontente com o corte de horas extras, adicionais noturnos, demissão de servidores que não se enquadram às mudanças e às prisões por maus-tratos. Os adolescentes que são testemunhas do episódio de espancamentos vão ficar separados durante toda a apuração desse crime. As mães dos internos vítimas de agressão que continuam foragidos serão contatadas pelo Programa de Proteção à Vida das Testemunhas. Até as 20 horas de ontem, 116 fugitivos haviam sido recapturados e levados de volta ao complexo. Esses internos ficarão no isolamento por, no mínimo, cinco dias.