Título: Uma noite para o PT não esquecer
Autor: Vera Rosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/02/2005, Nacional, p. A4

Às seis e meia da manhã ontem, quando o presidente da Câmara anunciou o 249.º voto para Severino Cavalcanti (PP-PE), a maioria dos que estavam no plenário - que resistiam ao cansaço de mais de 13 horas - começou a gritar: "É o tsunami! É o tsunami!" Imediatamente, uma chuva de papéis picados caiu sobre o vencedor. Severino era um sorriso só. Acabava de impor derrota acachapante ao candidato oficial do governo e do PT, Luiz Eduardo Greenhalgh (SP). Ele levou quase dez minutos para caminhar do fundo do plenário à Mesa, para assumir a presidência. Os cumprimentos o atropelavam na passagem e até colegas de partido, que antes o criticaram por lançar a candidatura avulsa, abraçavam-no entusiasmados. E, é claro, ao lado estava o deputado Robson Tuma (PFL-SP), conhecido como o maior "papagaio de pirata" da Câmara.

"Não queremos mais nenhum ministério!", gritava o presidente do PP, deputado Pedro Corrêa (PE). Ainda atordoado com a vitória, Severino assumiu a presidência da Casa e foi beijado por sua mulher, Amélia, depois de anunciar que ela estava lá, bem como outros familiares.

Quatro horas antes, assim que terminou a apuração do primeiro turno, ele e seus aliados iniciaram uma maratona pelos gabinetes da Câmara, em busca da vitória final. "Não sei onde estão me levando", respondia o deputado, por volta das 3 horas da madrugada, quando era carregado de um lado para outro por seus correligionários.

O encontro mais demorado foi com Virgílio Guimarães (PT-MG). Tentou até o último instante ganhar seu apoio. Não foi bem sucedido, O dissidente petista preferiu apoiar Greenhalgh. Mas os votos de Virgílio acabaram sendo transferidos para Severino.

A necessidade de realizar dois turnos para eleger o novo presidente da Câmara pegou de surpresa dezenas de deputados que já haviam deixado a Casa e foram obrigados a voltar. Foi o caso do deputado Fernando Gabeira (sem partido-RJ), que às 3h30 desembarcou de um táxi na entrada principal da Câmara com uma touca azul marinho na cabeça. "Estava em casa acompanhando a sessão pela televisão e quando vi que ia ter segundo turno vim correndo", contou.

O intervalo entre o primeiro e o segundo turno foi de grande movimentação na busca dos votos. Deputados petistas procuraram Virgílio e tentaram um acordo: levar os votos que teve no primeiro turno para Greenhalgh em troca de não ser punido pela rebeldia. Quase ao mesmo tempo, os cerca de 100 integrantes da bancada ruralista decidiam votar no candidato do PP.

CAÇA AOS VOTOS

Assim como Severino, Greenhalgh não parou e foi procurar apoio no PSDB, no PFL e no PL. Na liderança do PFL, ele causou uma saia-justa ao tentar se reunir com a bancada pefelista da Bahia, que o apoiava, contrariando o líder Rodrigo Maia (PFL-RJ).

José Mentor (SP) e outros petistas também irritaram tucanos ao acusá-los de traição por não terem dado mais votos a Greenhalgh. Isso criou um clima negativo na bancada, que teria dado 32 votos para o petista, e virou votos a favor de Severino no segundo turno. "Eles deviam agradecer mesmo que fossem 5 votos", provocou o líder do PSDB, Custódio Mattos (MG).

Em meio à constatação de que estava muito difícil garantir a eleição de Greenhalgh, o ministro das Comunicações, Eunício Oliveira (PMDB), foi à Câmara tentar conseguir votos entre seus aliados e em seu partido. Ao mesmo tempo, o secretário de Governo do Rio, Anthony Garotinho (PMDB), desembarcou na Câmara para se reunir com os peemedebistas e prometeu 52 votos a Severino. A esta altura das articulações, os petistas já calculavam um índice de traição da ordem dos 30% e reconheciam que a situação era muito difícil para seu candidato.

Ao todo, a sessão para escolher o presidente da Câmara demorou 13h45. A votação de primeiro turno levou 7 horas. As urnas foram abertas às 18 horas de segunda-feira e 510 deputados votaram até a 1 hora da madrugada. Apenas três faltaram: Ênio Tatico (PTB-GO), Neiva Moreira (PDT-MA) e Reinaldo Betão (PL-RJ).

A apuração dos votos levou mais 1h15. No segundo turno, o quórum foi menor, 498 do total de 513 deputados. Faltaram 15 parlamentares à sessão. A votação foi mais rápida. Levou 1h20. A apuração, 1 hora.