Título: Uma lista de 140 marcados para morrer
Autor: Vannildo Mendes
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/02/2005, Nacional, p. A12

Pode chegar a 140 o número de pessoas ameaçadas de morte no País, por causa de conflitos na zona rural - a maioria deles envolvendo questões de posse da terra. Uma lista com os nomes das pessoas e as localidades onde ocorreram as ameaças será divulgada hoje pela Comissão Pastoral da Terra (CPT). Na lista que a CPT estava revisando até ontem à noite, o nome da religiosa americana Dorothy Stang, assassinada no sábado, aparece duas vezes. "Isso ocorre porque prometeram matá-la em mais de um lugar e por motivos diferentes", explicou o secretário-executivo da CPT, Antonio Canuto.

Na lista também aparecem os nomes de dois bispos, três padres católicos, um padre anglicano e três agentes pastorais. Os bispos são d. Pedro Casaldáliga e d. Heriberto Hermes, que atuam nas prelazias de S. Félix do Araguaia e de Cristalândia, respectivamente.

O primeiro é espanhol, nascido na Catalunha, e o segundo, americano, do Kansas. No passaporte e em outros documentos oficiais, ele se chama Heribert. Um dos padres mais ameaçados, o franciscano Xavier Plassat, que vive no Tocantins, é de origem francesa.

Os dois bispos foram ameaçados por defenderem grupos indígenas em disputas de terras com fazendeiros nos Estados de Goiás e Tocantins. D. Heriberto decidiu ir à polícia em novembro do ano passado, depois que um fazendeiro envolvido no conflito gritou-lhe que o caso ainda ia acabar com derramamento de sangue. "Um dia, quando eu atravessava um rio de balsa, para me encontrar com os índios, esse fazendeiro começou a falar bem alto que a melhor coisa que se podia fazer pela região era jogar eu e o padre que me acompanhava para as piranhas e os jacarés", disse o religioso americano.

Da ordem dos beneditinos, com 71 anos, ele dirige a Prelazia de Cristalândia há 14 anos. Afirma que as ameaças são comuns e que as romarias católicas da região costumam homenagear os mártires da luta pela terra. O mais conhecido é o padre Josimo Tavares. Foi assassinado com dois tiros à queima-roupa, em maio de 1986, por um pistoleiro que o esperava diante da porta de entrada da sede da CPT em Imperatriz do Maranhão. Tinha 33 anos.

Na lista também figuram os nomes dos quatro funcionários do Ministério Trabalho - três fiscais e um motorista - assassinados em janeiro do ano passado, em Unaí, interior do Estado de Minas. "Eles estão lá porque registraram as ameaças de morte que vinham recebendo por causa das investigações sobre trabalho escravo", diz Canuto.

PROCURADOR

Outros funcionários públicos aparecem na lista. Entre eles um procurador do Ministério Público, de Palmas, no Tocantins. Seu nome aparece associado a denúncias contra o trabalho escravo no Tocantins.

Preparada a partir de informações de agentes pastorais enviadas à sede da CPT, em Goiânia, e material publicado pela imprensa, a lista não é muito precisa. Em alguns casos aparece apenas o apelido da pessoa ameaçada, como Raimundinho, líder rural de Paragominas, Mato Grosso. Em outros a referência é ainda mais vaga. No caso de um conflito ocorrido em Sinop, no mesmo Estado, os ameaçados seriam "líderes do acampamento".

O objetivo da CPT com a divulgação da lista é chamar mais uma vez a atenção para os problemas da violência e da impunidade, segundo declarações de representantes da entidade. Da entrevista coletiva convocada para hoje em Brasília deverão participar os bispos d. Tomás Balduíno, presidente da comissão, e d. Erwin Krautler, da Prelazia do Xingu - que abrange a região de Anapu, onde a irmã Dorothy foi assassinada.